Três autores de proeminentes universidades do Brasil, EUA e o Reino Unido – Thomas Hone e os professores James Macinko e Christopher Millett – em recente publicação do jornal The Lancet discutiram a inter-relação entre a Atenção Primária à Saúde (APS) e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a partir da revisão de evidências que comprovaram que os países que escolheram reorientar seus sistemas de saúde para a APS têm maiores chances de atingir os ODS dentro do prazo de 2030, comparados aos países com sistemas de saúde centrados na atenção hospitalar e países com baixos investimentos no setor saúde.
Os ODS foram adotados por representantes dos 193 Estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) em setembro de 2015, como sucessores aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) elaborados em 2000 para orientar a ação dos governos nos níveis internacional, nacional e local por 15 anos. Os autores apontaram que a falta de referência à APS nos ODS reflete a implementação decepcionante, até o momento, dos princípios de Alma Ata, atribuindo esta deficiência à má interpretação da Declaração, baixa motivação política e financiamentos limitados.
Para reforçar seus argumentos, os pesquisadores destacaram a diferença entre a APS e os serviços de atenção básica (primary health care and primary services), ressaltando que embora os últimos sejam vitais, são apenas um de vários componentes necessários a organização da APS. Ademais propuseram interpretar a APS como uma visão social para a saúde e o desenvolvimento, e como plataforma para articular diferentes movimentos baseados em princípios chaves comuns, a saber: a intersetorialidade da saúde, a promoção da saúde, os determinantes sociais da saúde, a cobertura universal de saúde, a inequidade em saúde, abordagens para o desenvolvimento da primeira infância e do curso da vida, e cuidados centrados na comunidade e no paciente.
Em relação aos ODS, os pesquisadores apresentaram duas extensas tabelas que descrevem como a APS pode contribuir não apenas para o objetivo 3, especificamente relacionado à saúde (Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades), mas como para o alcance de todos os outros 16 ODS, a saber: 1) Erradicação da pobreza; 2) Fome zero e agricultura sustentável; 4) Educação de qualidade; 5) Igualdade de gênero; 6) Água potável e saneamento; 7) Energia accessível e limpa; 8) Trabalho decente e crescimento econômico; 9) Indústria, inovação e infraestrutura; 10) Redução das desigualdades; 11) Cidades e comunidades sustentáveis; 12) Consumo e produção responsáveis; 13) Ação contra a mudança global do clima; 14) Vida na água; 15) Vida terrestre; 16) Paz, justiça e instituições eficazes; 17) Parcerias e meios de implementação.
Os autores também traçaram uma conexão entre a APS declarada em Alma Ata e o surgimento do movimento da cobertura universal de saúde (Universal Health Coverage – UHC), citando como a declaração de 1978 demandava que a atenção à saúde seja acessível universalmente e para todos. Ademais defenderam que para enfrentar as preocupações que a UHC seja enfocada demais em serviços curativos é preciso incorporá-la com a visão de saúde mais ampla da APS.
Finalmente, depois de reconhecer os esforços durante a última década para incluir a APS na agenda global, os autores ressaltaram que ainda permanecem desafios e encorajaram os países e instituições internacionais a valorizar a APS enquanto estratégia fundamental para alcançar os ODS.
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Por Diana Ruiz e Valentina Martufi – doutorandas que contribuem para a REDE APS