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Arquivo Diário 17 de fevereiro de 2014

Cooperação com Paraguai vira exemplo para as Américas

A experiência de sucesso da cooperação bilateral Brasil – Paraguai ganhou uma publicação da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas/OMS), na série Boas práticas da gestão de termos de cooperação. Essa iniciativa teve origem em 2008, quando a ENSP passou a apoiar o Paraguai no processo de reordenamento de seu sistema de saúde, por meio de uma assessoria técnica para a implementação da Estratégia de Saúde da Família (ESF) no país. Toda a metodologia utilizada nesse processo foi detalhada na publicação e, segundo o documento, é possível que ela seja aplicada em outras iniciativas de cooperação Sul-Sul, levando-se em consideração os sistemas de saúde e a história de cada sociedade. O documento está disponível para acesso.
O programa de saúde da família, comprovadamente, permitiu ao Brasil melhorar seus impactos de saúde e, consequentemente a isso, aumentar a eficácia de outras políticas públicas sociais aqui implementadas. Buscando reestruturar o sistema de saúde do seu país e apoiado nos bons resultados brasileiros, o Paraguai estabeleceu esta cooperação com o governo brasileiro através do Ministério da Saúde e da Fiocruz e Opas.
A publicação, intitulada Cooperação Técnica entre Brasil e Paraguai para a Implementação do Programa Saúde da Família no Paraguai, teve como autores Carlos Eduardo Aguilera Campos, docente da Residência Multiprofissional em Saúde da Família da ENSP/Fiocruz e da Residência e Internato em Medicina de Família e Comunidade da UFRJ, Erica Kastrup e Ana Laura Brandão, ambas da Cooperação Internacional da ENSP, e a consultora jurídica no Brasil e Espanha em elaboração de acordos, convênio e contratos internacionais da Opas/OMS, Roberta de Freitas.
Carlos Eduardo, Erica e Ana Laura integram, desde o início do processo, a equipe técnica responsável pela cooperação Brasil-Paraguai. Ana Laura ressaltou que a experiência apresentada nesta publicação vai além da história vivida nesses cinco anos de cooperação bilateral. Segundo ela, a iniciativa é um exemplo de como os países das Américas podem aprender juntos, guiados pelos ideais políticos de acesso universal, e baseados sempre na busca e utilização das melhores evidências, práticas e no aperfeiçoamento de melhores instrumentos.
Erica lembrou que a integração em redes internacionais está entre as orientações estratégicas de cooperação internacional executadas pela ENSP. De acordo com ela, no campo das políticas públicas de saúde, as redes internacionais são espaços de informação, articulação e compartilhamento de experiências que apoiam os processos de inovação e desenvolvimento de políticas em prol da saúde global. “Por isso, a ENSP integra diversas redes de conhecimento e, no âmbito da cooperação Sul-Sul, exerce a secretaria executiva da Rede de Escolas de Saúde Pública da Unasul”, constatou ela.
Erica disse ainda que a Resp/Unasul, por seu caráter governamental, constitui uma rede de Escolas de Governo, representando um espaço de articulação e produção de novas tecnologias que contribuam diretamente para o aprimoramento dos sistemas de saúde da região. “Sistematizar estas experiências de cooperação bilateral está entre os trabalhos da Secretaria Executiva da Resp, pois a implementação e qualificação de estratégias de Atenção Primária à Saúde (APS) nos países que compõem a Unasul é um desafio comum a todos”, defendeu.
Fonte site ENSP – http://www.ensp.fiocruz.br

Pagamento por desempenho na atenção primária no Reino Unido

Margareth Crisóstomo Portela

A ideia de que consequências positivas induzem comportamentos é baseada em teorias e dá suporte ao uso do pagamento por desempenho para a melhoria da qualidade do cuidado à saúde. Em prática, entretanto, existe insuficiente evidência sustentando incentivos financeiros para a melhoria da qualidade da atenção primária. O uso do pagamento por desempenho tem crescido, mas tem sido controverso e atingido pouco, levantando questões sobre os mecanismos envolvidos, como eles atuam e se o seu desenho está inadequado.

Este fascículo apresenta os achados de Norman et al. (p. 55-67) sobre percepções de médicos generalistas (GPs) em relação ao pagamento por desempenho britânico baseado na Quality and Outcomes Framework (QOF). Sendo um dos maiores esquemas de pagamento por desempenho do mundo, ele gera debates apaixonados sobre as suas características e efeitos, e expectativas pelo papel exemplar que pode desempenhar para o desenho e implementação de intervenções de pagamento por desempenho na atenção primária.

A QOF foi introduzida no Reino Unido em 2004, e resultados acerca do seus efeitos são ainda limitados, com poucos estudos provendo comparaçõesante-post com tempo de seguimento suficiente. Por um lado, a evidência existente indica que a QOF tem impacto reduzido na melhoria de resultados no cuidado à saúde devido ao foco em indicadores de processo e padrões inconsistentes e mais baixos do que aqueles estipulados por diretrizes clínicas. Por outro, a QOF tem evoluído, buscando mais transparência e independência, e movendo-se do foco no processo para o foco nos resultados do cuidado. Nesse espírito, o National Institute for Health and Care Excellence (NICE) tem assumido a liderança no desenvolvimento de indicadores clínicos e de saúde pública desde 2009.

Em contraste com a posição de Norman et al. sobre o papel da variabilidade e padronização do cuidado à saúde, a minha visão é que alguma padronização baseada em boa evidência é necessária e inerente à melhoria da qualidade do cuidado à saúde. Parte da variabilidade nas práticas no cuidado à saúde podem ser legitimamente atribuídas a escolhas pertinentes, mas parte certamente é atribuível ao cuidado inadequado. Um outro estudo (Lester H et al. Br J Gen Pract 2013; 63:e408-15) contradiz Norman et al., apontando para a aceitação do pagamento por desempenho como parte da rotina na atenção primária na Inglaterra, para a base em evidência dos indicadores como um fator chave para o seu sucesso, e para as formas mais individualistas e menos estruturadas de trabalho como má prática. Em relação às consequências não intencionadas indesejáveis da experiência de pagamento por desempenho britânica, parece mais consistente a percepção de que houve um impacto negativo no profissionalismo médico, com indução de consultas focadas em “checar itens”, alguma perda de autonomia, e a tendência de uma minoria de GPs priorizar o seu pagamento e não os interesses dos pacientes. Demandas por mais indicadores valorizando o cuidado preventivo, a continuidade do cuidado e outros aspectos de uma visão mais holística do cuidado à saúde têm sido recorrentes.

O esquema de pagamento por desempenho britânico tem sido submetido a muitas mudanças e ainda é um “trabalho em progresso” que, certamente, sendo acompanhado, proverá lições sobre o pagamento por desempenho na atenção primária. Ao mesmo tempo, é fundamental que outras intervenções sejam desenhadas mais cuidadosamente, considerando a apreciação profunda de teorias que possam dar suporte aos seus componentes e envolvendo mais testes em diferentes contextos antes do uso em larga escala.

 

Editorial do Caderno de Saúde Pública – Vol. 30 – Rio de Janeiro – 2014  

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0102-311X20140001&lng=pt&nrm=iso