Faça parte da rede aqui!
Fique por dentro das últimas notícias, eventos, debates e publicações científicas mais relevantes.

Arquivo Mensal junho 2020

Experiência de reorganização da APS para o enfrentamento da Covid-19 em Rurópolis (PA)

Continuando com a divulgação de experiências de reorganização da APS para o enfrentamento da Covid-19 nos municípios brasileiros, trazemos esta semana o relato da Dra. Fernanda Jacqueline Teixeira Cardoso, Secretária de Saúde de Rurópolis, município rural no interior do Pará, 217 km ao sul de Santarém. Enfermeira efetiva do município desde 2005 na área hospitalar, a Dra. Cardoso é gestora de Rurópolis desde 2017. Antes de assumir o cargo, ela já tinha um bom conhecimento da APS, e umas inquietudes em relação à organização da rede do município. Portanto, quando entrou na gestão, sua prioridade foi reordenar o sistema local de saúde, apesar das restrições orçamentárias devidas à baixa arrecadação municipal. De fato, Rurópolis encontra-se entre os municípios mais pobres do estado, sendo que uma grande parte da população depende de auxílios como o Bolsa Família, e 99% é usuária do SUS. Apesar disso, a Secretária conseguiu que entre 2018 e 2019 todas as UBS tivessem melhorias em sua infraestrutura. Deste modo, quando chegou a pandemia a APS estava bem estruturada e melhor preparada para enfrenta-la.

No dia 27 de fevereiro a gestão municipal ativou-se para estabelecer referências técnicas locais e criou o Comitê de Operações Emergenciais (COE), com uma comissão gestora e mais 13 comissões: Educação em Saúde, permanente e comunitária; Comunicação; Assistência ambulatorial; Assistência Farmacêutica; Apoio Diagnóstico (Laboratorial, de Imagem e Eletrocardiográfico); Assistência Hospitalar; Disk Vigilância (monitoramento, Denúncias, Regulação); Fiscalização Sanitária; Transporte eletivo e de emergência de pacientes; Telecuidado; Sistemas de informação; Medidas Preventivas Comunitárias; e Logística, Insumos e abastecimento. Dedicaram-se assim, inicialmente, à sensibilização da população, com publicidade (materiais informativos, redes sociais, radio, carros de som volante) e educação (reuniões com as associações, igrejas e comércio), ao monitoramento, especialmente das pessoas que chegavam de fora, e ao atendimento aos pacientes com sintomas gripais. Porém, em maio começaram a ter pacientes clinicamente positivos por Covid-19, diagnosticando oficialmente o primeiro caso no dia 12 de maio.

Consequentemente, intensificaram as medidas: estabeleceram barreiras sanitárias, organizaram ações de sanitização e entregaram kits de proteção para idosos. O foco foi evitar que os casos suspeitos de Covid-19 entrassem em contato com os demais usuários da rede de saúde. Portanto, definiram que o paciente suspeito não deveria passar pelas UBS da cidade, e centraram o atendimento em uma Unidade Integrada de Vigilância em Saúde e Atenção Primária (UNIVAP), onde também se realiza coleta de exame. Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), retirados das visitas domiciliares, passaram a apoiar na triagem nas entradas das UBS, direcionando usuários suspeitos para a UNIVAP, onde seriam atendidos com horário agendado. Adicionalmente, alocaram uma ambulância exclusiva para Covid-19, com equipe, motorista e equipe hospitalar de referência, para evitar que os pacientes suspeitos de Covid-19 passassem pela sala de emergências.

A Secretária apontou as dificuldades para testagem por RT-PCR (do inglês reverse-transcriptase polymerase chain reaction), sendo que as amostras podem ser enviadas somente duas vezes por semana para a capital, demorando até 15 dias em obter os resultados. Portanto, a gestão passou a priorizar os testes rápidos: os pacientes suspeitos de Covid-19 são submetidos ao teste rápido, e podem pegar os resultados online, por ligação, ou impressos na unidade. Adicionalmente, decidiram incluir o diagnóstico por vínculo epidemiológico, identificando as pessoas em contato intradomiciliar com pacientes positivos que apresentaram sintomas. Outra dificuldade tem sido a escassez de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), que foi parcialmente resolvida com a separação de equipes de referência, priorizando os EPIs mais completos para os profissionais que precisam de maior proteção.

Em relação ao papel da APS, que foi organizada de forma integrada ao restante da rede de saúde do município, destacou-se a participação das equipes na organização da resposta, e na divulgação e coleta de informações. Também foram envolvidas nas barreiras sanitárias, onde procura-se cadastrar os que chegam de fora, para poder acompanhá-los via disque vigilância. No atendimento, os profissionais da APS estabeleceram estratégias alternativas para entrar em contato com os pacientes:  grupos de WhatsApp, consultas a distância, e, quando necessário, visitas domiciliares. Esta maneira alternativa de ver o atendimento, segundo a Dra. Cardoso, será o legado da pandemia para a APS, junto ao reforço de questões básicas como a lavagem das mãos e outras normas de biossegurança. De fato, como parte da prevenção do contágio, colocaram pias na parte externa das UBS.

21 dias depois do primeiro caso, o município de Rurópolis tinha 125 casos (incluindo os diagnosticados por vínculo epidemiológico), 200 suspeitos, e 3 óbitos. A Secretária ressaltou a importância de ter agido precocemente, o que contrabalançou os efeitos da resistência da população às medidas de isolamento social e lockdown, estabelecido quando teve o primeiro óbito por Covid-19.

A Dra. Cardoso apresentou a experiência de Rurópolis para o Comitê Gestor da Rede APS no dia 03 de junho. É enfermeira, graduada e especializada como intensivista pela Universidade do Estado do Pará (UEPA), mestre em Doenças Tropicais pela Universidade Federal do Pará (UFPA), doutora em Saúde Coletiva pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) e professora da UEPA. A Rede APS aplaude a presença de pessoas tão qualificadas e dedicadas na gestão municipal da saúde.

Para mais informações sobre a atuação da Secretaria Municipal de Saúde de Rurópolis, visite a página de FaceBook: https://www.facebook.com/SEMSARuropolis.

Por Diana Ruiz e Valentina Martufi, doutorandas do ISC/UFBA que contribuem para a REDE APS

 

 

 

Reuniões virtuais Comitê Gestor

Com o início da pandemia o comitê gestor da Rede APS passou a reunir-se virtualmente toda a semana (a partir de março de 2020) para discutir estratégias no enfrentamento da Covid-19.

Para o mês de JULHO estão programadas as reuniões nas seguintes datas 7, 14, 21 e 28 

 

Qual o papel da Atenção Primária à Saúde diante da pandemia provocada pela COVID-19?

Artigo de opinião publicado na Revista Epidemiologia e Serviços de Saúde pelos autores Thiago Dias Sarti, Welington Serra Lazarini, Leonardo Ferreira Fontenelle e Ana Paula Santana Coelho Almeida em que reforçam a necessidade de discutir o lugar da Atenção Primária à Saúde no enfrentamento a pandemia Covid-19,  alguns aspectos relativos à organização da APS e seu papel face aos desafios impostos pela doença no país.

Leia artigo

Relatório do 2 Seminário da Rede APS Experiências de fortalecimento da Estratégia Saúde da Família para o enfrentamento da Covid-19: o que podemos aprender?

O seminário “Experiências de fortalecimento da Estratégia Saúde da Família para o enfrentamento da Covid-19: o que podemos aprender? ” organizado pela  Rede de Pesquisa em APS da Abrasco com apoio do Cebes e participação do Conasems foi realizado em 9 de junho 2020 e fez parte da Marcha Pela Vida organizada pela Frente Pela Vida. O evento foi transmitido pela TV Abrasco no YouTube e sua gravação está disponível no link https://www.youtube.com/watch?v=Bk5lWekQ3yQ.

O objetivo do seminário foi analisar experiências locais de reorganização da atenção básica e iniciativas inovadoras na Estratégia Saúde da Família para o enfrentamento da pandemia de Covid-19 e discutir fragilidades encontradas em diferentes contextos.

As experiências de reorganização da APS no contexto da pandemia apresentadas no seminário possibilitam diversos aprendizados. Desde o primeiro momento, a Rede de Pesquisa APS acompanha o desdobramento da crise sanitária da Covid-19, as principais medidas que vem sendo adotadas para seu enfrentamento e recomenda diretrizes para a organização dos serviços de saúde de AB nesta fase.  Ao tratar dos principais fundamentos da APS no Brasil, expressos na organização da ESF, aponta três eixos de atuação na pandemia, mostrando a relevância de sua interação. São eles:

(1) desenvolvimento de ações de vigilância em saúde para bloquear e reduzir o risco de expansão da pandemia, e cuidado aos casos leves,

(2) oferta de suporte a grupos mais frágeis e vulneráveis que necessitarão de atenção especial durante a pandemia, e

(3) continuidade das ações próprias da atenção primária na sua rotina de promoção da saúde, prevenção de agravos e provisão de cuidados

Em um segundo momento, a Rede se aproxima de experiências governamentais e institucionais de reorganização da APS e seleciona cinco casos de municípios de diferentes portes populacionais, grau de implantação e consolidação de estrutura de atenção nos moldes da ESF e de organização do Sistema Único municipal – Florianópolis (SC), Sobral (CE), Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro/Complexo do Alemão (RJ) e Niterói (RJ) – para compreender como se deu sua atuação  inovadora para o cuidado e o controle do contágio.

A troca entre gestores, profissionais de saúde, lideranças comunitárias e pesquisadores do Comitê Gestor da Rede APS, em tempos de enfrentamento da pandemia, reúne alternativas de organização da atenção primária à saúde em âmbito municipal ou local e de organização comunitária que potencializa a análise das interfaces Estado e Sociedade, e coloca a atenção primária em um lugar estratégico e dialógico para novas formas de organização do cuidado. Com isto desmitifica relações sociais restritivas, aproxima atores e diversos segmentos sociais envolvidos.

As narrativas e informações de representantes responsáveis por essas iniciativas parcialmente divulgadas em boletins de notícias da Rede APS, vem a público reunidas neste segundo seminário sobre os desafios da APS em tempos de Covid-19 pelo desejo de compreender a natureza diversa dessas experiências, moldadas pelo contexto social, econômico e cultural de seus territórios, e suas potencialidades e contribuições à vida social. Nosso esforço é encontrar aspectos convergentes nas propostas de uma atualização do processo social e deixar um legado para novos tempos.

A sistematização dessas experiências constrói conhecimento que valoriza o SUS e a reorganização da APS cujos detalhes singulares podem ser exemplos concretos de possibilidades e alternativas a serem visitadas. Nenhuma experiência é em si absoluta ou representa uma nova totalidade, mas todas indicam dimensões a serem observadas e adaptadas à realidade da pandemia em cada local.

Sinteticamente podemos elencar sete lições aprendidas neste tempo de pandemia Covid-19:

1 – O SUS nacional importa muito, é um patrimônio da sociedade brasileira que se mostra capaz de responder a suas necessidades básicas mesmo com os constrangimentos de financiamento a partir do nível federal somados a falta de repasses solidários na crise;

2 – Todas as pessoas e vidas merecem ter um atendimento integral, efetivo e resolutivo a partir do território em que vivem e dependem de total requalificação da ESF e de suas equipes de profissionais restritas e ampliadas, articulando a rede de atenção em todos os níveis;

3 – As ações básicas de Vigilância em Saúde e APS ao serem intensificadas apoiam o enfrentamento da pandemia, com o correto monitoramento de sua evolução para apoio da tomada de decisão, do acompanhamento de casos confirmados e suspeitos e da continuidade do cuidado;

4 – A implementação da integração dos serviços a partir de uma regulação pública da rede de serviços de saúde é condição necessária para preservar a integralidade;

5 – Em uma crise, a coordenação da ação deve considerar a intersetorialidade para que seja garantido apoio à população em geral quanto à renda, trabalho, alimentação e o acolhimento adequado dos casos dos grupos vulneráveis;

6 – A introdução de inovações tecnológicas no atendimento, na comunicação social e popular, com universalização da conectividade de internet e uso de aplicativos para reduzir o contágio, favorecer o distanciamento social, estender a proteção social com uso de EPI pelos profissionais envolvidos e máscaras artesanais para toda a população é fato novo que veio para ficar, porque imprescindível para a qualidade da atenção;

7 – A necessidade de formulação de políticas sociais e econômicas mais abrangentes que atendam diversos segmentos afetados pela medida severa de isolamento e restrição de circulação e em consonância com novas formas de governança que incluam a gestão pública e os instrumentos coletivos de poder originários das comunidades e da sociedade civil em prol da redução das desigualdades e implementação de políticas públicas de igualdade.

Assim dois desafios se destacam – escutar a demanda de participação política e social na condução de políticas públicas nas grandes cidades e sua periferia que já se destaca pela intensidade com que evidencia a falta de coordenação central da política de saúde, diante da pandemia que se espalha das zonas nobres das cidades para a periferia e finalmente para o interior, suas áreas remotas e rurais, povoadas de minorias igualmente excluídas.

Pelo lado das instituições governamentais, o movimento setorial até aqui mostrou-se pouco solidário intra-município e intermunicípios, o que pode exigir mais esforços em avançar nas diretrizes do SUS quanto à regionalização, condição de dar à APS mais fortaleza na sua posição de coordenação do cuidado. Tal desvelamento não ignorado também traz o desafio de ampliar outros sentidos como a visão, a interlocução e formulação que implique um caminho possível para uma ação comportamental menos calcada na retórica e mais dialógica.

Espera-se então dos governos estaduais e municipais, que mantenham a luta pela responsabilização compartida do governo federal com apoio financeiro efetivo para fazer frente aos eventos e recursos a serem providos em face da gravidade da pandemia, e que, contudo, são insuficientes para preservar o direito à Saúde e à Vida de modo universal.

Na mesa de abertura Luiz Augusto Facchini destacou a importância do evento para debater os avanços e desafios da APS neste momento de subnotificação de casos e sonegação de informação. Gulnar Azevedo (Abrasco) salientou a importância do SUS, da APS e do trabalho em rede para o enfrentamento à pandemia e convidou para participar da Marcha Pela Vida. Lucia Souto (CEBES) chamou a atenção sobre a experiência de construção do SUS e do direito à saúde como construção sociopolítica e cultural da sociedade brasileira e chamou à ação contra as afrontas à democracia num ato de grande amor ao Brasil. Cristiane Pantaleão (Conasems) destacou a importância do evento para compartilhar experiências exitosas que possam ajudar outros gestores na reorganização da atenção à saúde neste momento de pandemia e apontou a necessidade de fortalecimento do SUS.

O painel iniciou com a Experiência de Belo Horizonte (MG) apresentada por Fabiano Guimarães, gerente de Atenção Básica da SMS-BH, que buscou integrar sua rede SUS para o enfrentamento à pandemia a APS. Destacou o importante papel da APS na identificação precoce e ação resolutiva nos casos leves, no encaminhamento rápido e adequado nos casos graves, no acompanhamento dos pacientes de grupos de risco, na coordenação do cuidado, no suporte familiar e comunitário, na divulgação de informações confiáveis baseadas na ciência e na valorização do SUS (Guimarães et al, 2020).

Na experiência de Sobral (CE) apresentada por Marcos Aguiar Ribeiro coordenador de Vigilância do Sistema de Saúde-SMS realçou a importância do fortalecimento do SUS e da APS territorializada com abordagem familiar e comunitária no município para o enfrentamento à Covid-19. Salientou o fortalecimento das ações de vigilância com perspectiva territorial, o cuidado articulado nos diferentes pontos da rede de atenção e a ressignificação e adaptação das ações de atenção à saúde ofertadas na APS (Ribeiro et al, 2020).

O teleatendimento e a continuidade dos cuidados de rotina desenvolvidos pelas equipes de saúde da família foi destaque na experiência de Florianópolis (SC) apresentada por Ronaldo Zonta coordenador do Departamento de Gestão da Clínica da SMS. Em Florianópolis, o enfrentamento à Covid-19 acelerou mudanças no processo de trabalho orientadas ao teleatendimento e à realização de teleconsultas, com a incorporação de tecnologias de comunicação como telefone, internet, WhatsApp e videochamada (Silveira & Zonta, 2020).

Na experiência da Clínica de Familia Zilda Arns no Complexo do Alemão (RJ)[i] apresentada por Humberto Sauro, médico de familia e comunidade preceptor do Programa de Residência em MFC da SMS, destacou-se a criação de um Painel de Monitoramento de Covid-19 local que é atualizado diariamente através de uma planilha de Google Forms e surgiu pela demanda da comunidade por dados confiáveis locais, nos quais se apoiar para fortalecer a adesão da população às medidas de isolamento social. Também chamou a atenção, a experiência de articulação com movimentos e associações comunitárias como o Coletivo Papo Reto, o jornal Voz da Comunidade e o Coletivo Mulheres em Ação pelo Alemão. Essa articulação tem permitido estabelecer estratégias comunitárias para combater as fake News, divulgar informações de qualidade e apoiar a distribuição de cestas básicas, dentre outras.

A ação articulada entre APS e políticas sociais para o enfrentamento à Covid-19 foi destaque na experiência de Niterói (RJ) apresentada por Aluisio Gomes da Silva Junior, diretor do Instituto de Saúde Coletiva –UFF. Em Niterói, foi estabelecido um Comitê de Crise pela prefeitura municipal em articulação com as universidades que atuam no município (UFF, Fiocruz e UFRJ): intensificaram-se as ações de vigilância epidemiológica, realizou-se mapeamento das populações em vulnerabilidade, foram distribuídos kits de limpeza e máscaras de pano (encomendadas aos artesãos do município), houve contratação emergencial de profissionais da saúde para reforçar as equipes de saúde, organizou-se o laboratório de referência, foram reorganizados os fluxos nas unidades, foi estabelecido um complemento de renda municipal para os beneficiários do Bolsa Familia e para pessoas em informalidade, estabeleceu-se o pagamento de folha de pequenas empresas com recursos municipais, por três meses com o compromisso de não demissão por 6 meses, dentre outras ações (Junior et al, 2020). Além dessas importantes ações, também foram apontados alguns desafios como a dificuldade para receber recursos federais, a grave situação dos municípios vizinhos e a grande pressão de empresários e moradores para o relaxamento das medidas de isolamento social.

A apresentação de Cristiane Pantaleão, vice-presidenta do Conasems destacou a importância da APS como ponto central da rede de atenção à saúde. Salientou que o Conasems e o Conass estão atentos, escutando os municípios que precisam de ajuda neste momento e têm publicado guias para orientar o trabalho na APS, não somente para a atenção e acompanhamento dos casos de Covid-19, como também para a continuidade das ações rotineiras da APS com foco nos mais vulneráveis, com ações nos territórios e levando à prática as diretrizes da APS. Além disso, salientou a necessidade de continuar divulgando experiências exitosas de organização do SUS municipal, convidou os assistentes a gravar vídeos de um minuto e marcar @conasemsoficial e @paginaconasems para divulgar as experiências.

Os assistentes ao seminário participaram e enviaram suas perguntas através do chat de Youtube fortalecendo o debate. Para terminar o painel, a pesquisadora Maria Helena Magalhães de Mendonça, membro do comitê gestor da Rede APS sintetizou aprendizados possíveis das experiências de reorganização da APS no contexto da pandemia. Destacou as ações desenvolvidas na Rede APS para contribuir no enfrentamento da Covid-19, na reflexão e divulgação de informações de qualidade e relevância, orientadas para profissionais da saúde que atuam nos serviços, gestores, pesquisadores e movimentos sociais em suas iniciativas (Mendonça et al, 2020).

No final da reunião convidou-se novamente aos participantes a se juntarem na Marcha Pela Vida. Aylene Bousquat membro do Comitê Gestor da Rede APS da Abrasco salientou que marchar pela vida é também marchar pelo SUS, o que implica reconhecer as dificuldades, fortalezas e experiências criativas que estão sendo feitas nos diversos municípios e equipes do país. Convidou todos os profissionais de AB a responder a pesquisa Desafios da Atenção Básica no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no SUS, realizada por iniciativa da Rede APS da Abrasco com o apoio da OPAS e coordenada por professores da USP, Fiocruz, UFBA e UFPEL pelo link  https://apscovidsus.pro.br/ . A pesquisa está orientada para os profissionais de saúde que atuam em serviços de Atenção Básica/ Atenção Primária à Saúde (AB/APS) e gestores municipais, distritais e coordenadores de AB e tem por objetivo identificar os principais problemas e as estratégias de reorganização da AB utilizadas no enfrentamento da Covid-19 nos municípios brasileiros.

Durante o seminário foi também lançado um número especial da APS em Revista – Relatos de experiências locais da APS no Enfrentamento da COVID-19, que traz um mosaico de experiência locais que demonstram que ainda em um panorama de grandes , o SUS, a APS e o compromisso dos gestores, profissionais de saúde e pesquisadores permitem fazer frente à Covid-19. A revista traz relatos de Belo  Horizonte (MG), Canaã dos Carajás (PA), Florianópolis (SC),  Ilhéus  e  Itabuna  (BA),  Londrina  (PR), Nova Lima (MG), Niterói (RJ), Petrolina (PE), Recife (PE), Rio Branco (AC),  Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Sobral (CE) e Vitória (ES).

Boletim elaborado por Diana Carolina Ruiz, Valentina Martufi e Maria Helena Magalhães de Mendonça  

Referências

Guimarães, F., Carvalho, T., Bernardes, R., & Pinto, J. (2020). A organização da atenção Primária à Saúde de Belo Horizonte no enfrentamento da Pandemia Covid 19: relato de experiência. APS EM REVISTA, 2(2), 74-82. https://doi.org/10.14295/aps.v2i2.128

Junior, A., Latgé, P., de Oliveira, R., Franco, C., & Vasconcelos, M. (2020). A experiência de Niterói no enfrentamento da COVID 19: notas preliminares sobre a articulação de políticas sociais e de saúde. APS EM REVISTA, 2(2), 128-136. https://doi.org/10.14295/aps.v2i2.126

Mendonça, M. H., Silva Junior, A., Cunha, C. L., & Latgé, P. (2020). A pandemia COVID-19 no Brasil: ecos e reflexos nas comunidades periféricas. APS EM REVISTA, 2(2), 162-168. https://doi.org/10.14295/aps.v2i2.124

Ribeiro, M., Júnior, D. G. A., Cavalcante, A. S. P., Martins, A., de Sousa, L., Carvalho, R., & Cunha, I. C. K. O. (2020). (RE)Organização da Atenção Primária à Saúde para o enfrentamento da COVID-19: Experiência de Sobral-CE. APS EM REVISTA, 2(2), 177-188. https://doi.org/10.14295/aps.v2i2.12

Silveira, J. P., & Zonta, R. (2020). Experiência de reorganização da APS para o enfrentamento da COVID-19 em Florianópolis. APS EM REVISTA, 2(2), 91-96. https://doi.org/10.14295/aps.v2i2.122

 

 

 

[i] Maiores detalhes sobre a experiência de telemonitoramento da CF Zilda Arns e a articulação com a comunidade no Complexo do Alemão serão publicados em próximos boletins da Rede APS

APS: desvelando os bastidores políticos e o seu lugar na pandemia Covid-19

O Journal of Management and Primary Health Care e a Universidade Federal de Uberlândia por meio da Escola Técnica de Saúde realizam hoje, 10 de junho (quarta-feira) às 18h30 o webdebate “Atenção Primária à Saúde: desvelando os bastidores políticos e seu lugar na pandemia Covid-19”. 

Palestrantes:

Profa. Lígia Giovanella (ENSP/Fiocruz  e coordenadora da Rede APS)

Prof. Jonathan Fillipon (Queen Mary University of London, Inglaterra)

Prof. Carlos Ocké-Reis (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e Associação Brasileira de Economia da Saúde, Brasil)

Mediação

Prof. Leonardo Carnut (JMPHC e Universidade Federal de São Paulo)

Link para acesso: https://www.youtube.com/watch?v=iHEkCYm_pJ4

Esta live conta com o apoio das seguintes entidades que fortalecem a Atenção Primária à Saúde universal, pública, estatal e interprofissional:

Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM)

Associação Brasileira de Enfermagem de Família e Comunidade (Abefaco)

Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres)

Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (DIESAT)

Federação Nacional dos Farmacêuticos (FENAFAR)

Fonte: http://www.jmphc.com.br/jmphc

Experiências de atuação NASF no enfrentamento da COVID-19

O NASF

A transição epidemiológica no Brasil é marcada por uma mudança no perfil de morbimortalidade da população brasileira, com o aumento considerável de enfermidades crônicas não transmissíveis (FONSECA, 2015) e o desafio de estruturar um modelo de atenção à saúde, com a Atenção Primária à Saúde (APS) como centro articulador da Rede de Atenção (RAS) (MENDES, 2011; Brasil, 2015). Evidências nacionais e internacionais corroboram para a importância da APS, sinalizando a existência de diferentes arranjos na composição de profissionais a fim de garantir o cuidado integral (BORCADO et al., 2018). Portanto, com o intuito de potencializar a atuação da equipe mínima da APS, foi publicada a Portaria Nº 154, de 24 de Janeiro de 2008 (Brasil, 2008), que criou os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). O objetivo do Ministério da Saúde (MS) foi o de apoiar a consolidação da APS no Brasil, ampliando as ofertas de saúde na rede de serviços, assim como a resolutividade, a abrangência e o alvo das ações (Brasil, 2011). Os núcleos são compostos por equipes multiprofissionais que atuam de forma integrada com as equipes de Saúde da Família (eSF), as equipes de atenção primária para populações específicas (consultórios na rua, equipes ribeirinhas e fluviais) e com o Programa Academia da Saúde.

As Políticas Nacionais de Atenção Básica (Brasil, 2011; Brasil, 2017) que sucederam a criação do NASF passaram a influenciar alguns aspectos da sua implementação. A PNAB 2011 modificou a composição das equipes, incluindo mais profissões nas elegíveis para ser incluídas, e propondo o quantitativo de trabalho contratado em termos de horas semanais (Brasil, 2011), em vez que número de profissionais (Brasil, 2008). Com a Portaria Nº 3.124, de 28 de dezembro de 2012 (Brasil, 2012), criou-se uma terceira modalidade de conformação de equipe: o NASF 3, que teve como requisito mínimo para implantação que o município tenha ao menos uma equipe de Saúde da Família. Após quase uma década de implantação incremental, o NASF começou a ser atingido a partir da publicação da Portaria Nº 2.436, de 21 de Setembro de 2017 – também conhecida como a 3ª PNAB, onde as possibilidades de composição dos profissionais dos núcleos são mantidas, mas a carga horária não está detalhada (Melo et al, 2018). Adicionalmente, os NASF passam a se chamar Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), suprimindo a noção de ‘apoio’, e recebem uma atribuição adicional: cobrir também as chamadas unidades básicas tradicionais (Melo et al, 2018). Porém, o impacto foi ainda maior quando houve a publicação da Portaria Nº 2.979, de 12 de Novembro de 2019, que instituiu o Programa Previne Brasil, estabelecendo um novo modelo de financiamento de custeio da APS (Brasil, 2019). A APS foi atingida por esta mudança em inúmeras maneiras (Massuda, 2020). Em particular, a mudança no financiamento da APS acabou com a garantia de recursos para o NASF, levando muitos municípios a fecharem suas equipes. Porém, houve também muitos municípios que mantiveram as equipes e suas atividades de apoio à APS.

A pandemia de COVID-19

A motivação para a criação do NASF permanece atual e necessária, especialmente no contexto da pandemia de COVID-19. Entretanto, (até o dia 02.06.2020) o MS ainda não publicou nenhum documento sobre a atuação do NASF. Por outro lado, o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS) e o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) publicaram um ‘Guia Orientador para o enfrentamento da pandemia na Rede de Atenção à Saúde’ (CONASEMS, 2020), onde o “antigo NASF” foi mencionado somente como provedor de apoio para atender “nas demandas multidimensionais” da população.

A Rede APS interessou-se então em conhecer e divulgar as experiências e iniciativas dos municípios e equipes NASF de todo o pais, abrindo uma chamada para contribuições através de grupos WhatsApp e contas Instagram dedicados ao NASF.

Assim, a pesquisa partiu do seguinte questionamento: Como as equipes NASF tem se organizado para dar suporte às equipes de APS e aos pacientes acompanhados de maneira que garanta o isolamento social vigente e, ao mesmo tempo, que preserve o vínculo e o cuidado com a comunidade?

Tivemos retorno de 5 coordenações municipais NASF e 3 equipes NASF atuantes em 3 das 5 regiões do Brasil: a Unidade Jardim Itu do SSC/GHC, de Porto Alegre – RS, da região Sul; as coordenações municipais NASF de Governador Valadares e Nova Lima – MG, da região Sudeste; e, da região Nordeste, as coordenações municipais NASF de Maceió – AL, Jaboatão dos Guararapes e Recife – PE, e as equipes NASF Vista Alegre e NASF Garcia/Federação, ambas em Salvador – BA.

De maneira geral, as iniciativas para adaptar as ações dos NASF ao contexto da pandemia partiram em parte das coordenações municipais NASF, com Notas Técnicas e apoio institucional, e em parte surgiram espontaneamente das equipes NASF, devido à necessidade de reinventar o próprio trabalho para atender às mudanças trazidas pela pandemia. Houve um esforço conjunto de profissionais de saúde, gestores e população visando a manutenção da oferta do maior número de serviços possíveis na APS, e apoiar a rede de saúde no enfrentamento da pandemia.

É possível identificar que o papel dos NASF durante a pandemia se dá em três áreas de atuação: no enfrentamento mais direto da pandemia de COVID-19; através da manutenção das atividades rotineira dos NASF e da APS; e no “cuidado dos cuidadores”, com estratégias para apoiar os profissionais de saúde. Nesses três aspectos destacaremos as ações semelhantes, com suas potencialidades, além dos eventuais desafios que estão permeando a atuação do NASF no contexto atual.

Atividades NASF para o enfrentamento direto da pandemia

Reorganização dos espaços e processos de trabalho

Para o enfrentamento da COVID-19, primeiramente houve a necessidade de implementar algumas adaptações estruturais e nos processos de trabalho, como trazido pela equipe NASF que se ocupa dos bairros de Garcia e Federação em Salvador (BA). Isso permitiria organizar o acolhimento, triagem e provisão de orientações nas Unidades de Saúde, que foi apoiado pelas equipes NASF de Governador Valadares (MG), Porto Alegre (RS), Recife (PE), e dos bairros soteropolitanos, brindando uma escuta qualificada às necessidades dos usuários. Em Jaboatão do Guararapes (PE) a eNASF participou de ações promovidas pela Prefeitura Municipal e Governo Estadual, realizando aferição de temperatura, distribuição de máscaras de proteção, orientações sobre distanciamento e isolamento social e higienização das mãos.

Telemonitoramento

A maioria das equipes NASF que contribuíram para o levantamento seguiram as indicações mais comuns feitas pelas autoridades sanitárias dos três níveis do governo, ou seja, participar do telemonitoramento dos sintomáticos respiratórios (ou casos suspeitos) e casos confirmados de COVID-19, além do acompanhamento dos pacientes que fazem parte dos grupos de risco. Está sendo responsabilidade das equipes NASF ligar estes casos diariamente, ou a cada dois dias, segundo a gravidade, necessidade, e protocolo previsto. Porém, segundo a coordenação municipal NASF de Maceió (AL), as equipes também fazem atendimento domiciliar quando necessário. Entre outras inciativas interessantes, a equipe NASF dos bairros Garcia e Federação de Salvador (BA) completou um mapeamento da curva de pessoas com COVID-19 no território, para conscientizar as equipes sobre a iminência da pandemia, e mostrar como evoluiu o contágio desde o começo através de um cartaz físico e um virtual, ambos atualizados cada semana.

Produção e divulgação de vídeos

Por outro lado, uma ação comum a todas as entidades que responderam ao levantamento foi a produção e divulgação de vídeos com dicas para se cuidar durante a quarentena, divulgados pelas redes sociais ou nos sites institucionais, com o propósito de ficar perto da comunidade durante este período de afastamento social. Atividades físicas para adolescentes, adultos e idosos, brincadeiras infantis, higienização dos alimentos, e uso correto de máscaras caseiras foram o foco das equipes de Nova Lima (MG). A equipe NASF dos bairros Garcia e Federação de Salvador (BA) concentrou os conteúdos em vídeos de até 1 minuto, cobrindo temas como fluxo de sintomáticos, o que a unidade continua oferecendo, fluxo de saúde bucal, explicitando o que é considerado uma urgência, e como usar a máscara e como descarta-la. Para a divulgação, esta equipe contou com o apoio de lideranças comunitárias locais, que haviam sido mapeadas anteriormente em um esforço da equipe de conhecer melhor a comunidade. Na equipe NASF de Vista Alegre, em Salvador (BA), todas as categorias de profissionais empenharam-se na produção dos vídeos. No município de Maceió (AL), a coordenação NASF confeccionou um vídeo recitando um cordel, com o objetivo de sensibilizar a população em geral sobre a temática Saúde mental em tempos de pandemia, de acordo ao documento da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2020). Outra iniciativa peculiar foi a prática de educação em saúde através de um “Xote do Coronavirus”, onde uma equipe NASF de Recife (PE) percorreu as ruas do bairro de carro com autofalante, tocando uma música que falava sobre as medidas de prevenção e de distanciamento social. Todas estas iniciativas tiveram uma boa recepção pela população.

Produção e divulgação de materiais escritos

Outra atividade comum a todos os relatos foi a produção de materiais informativos escritos, geralmente difundidos pelas redes sociais para os usuários ou para a comunidade geral. Estes incluíram: informação sobre saúde do idoso e COVID-19 em campanha vacinal, reforçando a importância do isolamento social, como no caso da equipe de Vista Alegre em Salvador (BA); cartilhas sobre saúde mental, e cuidado das crianças durante a pandemia, na experiência da Unidade Jardim Itu do SSC/GHC em Porto Alegre (RS); e no Município de Maceió (AL) socializou-se informações sobre a realidade ora vivenciada, focando nas formas de prevenção da COVID-19, e o cuidado voltado a crianças e adolescentes. Uma das equipes NASF de Recife (PE) tomou a interessante iniciativa de lançar um jornal criativo e de linguagem acessível à população, com receitas, dicas de atividades físicas, sugestão de filmes e informações sobre os profissionais das equipes de Saúde da Família.

Produção e distribuição de máscaras

Tanto a equipe dos bairros Garcia e Federação em Salvador (BA), quanto a coordenação municipal NASF de Maceió (AL), organizaram-se para a produção e distribuição de máscaras. A primeira organizou costureiras voluntarias no território para costurar mascaras caseiras, e distribuir gratuitamente para os mais vulneráveis. A segunda mobilizou as equipes para arrecadação de doações de tecidos e elásticos para confecção de máscaras, a serem distribuídas na comunidade. Neste caso, as máscaras são produzidas pelos profissionais das eNASF/AP, eSF e a comunidade, e são entregues com orientações de uso e higienização, conforme preconizado pela OMS.

Orientação para o auxílio emergencial

Por fora do atendimento à saúde direto, o assistente social da equipe de Vista Alegre de Salvador (BA) provisionou orientação para o auxílio emergencial, e o serviço social da Unidade Jardim Itu do SSC/GHC em Porto Alegre (RS) divulgou uma cartilha guia para o mesmo.

Papel das Coordenações Municipais NASF

As Coordenações Municipais NASF proveram apoio institucional através de reuniões remotas periódicas, por videoconferência, para discutir planejamento, organização, monitoramento e avaliação do trabalho e compartilhamento de informações e ideias, no caso de Maceió (AL) e Jaboatão dos Guararapes (PE). O apoio foi provisionado através de 02 Notas Técnicas que versam sobre o processo de trabalho do NASF, no caso de Recife (PE).

Manutenção das atividades rotineiras do NASF e da APS durante a pandemia

Coordenação com equipes APS e articulação com a Rede de Atenção

A atuação NASF rotineira foi impactada significativamente, dadas a quantidade de atividades envolvendo trabalhos presenciais em grupo. Devido ao isolamento social, as equipes tiveram que suspender os grupos de atividades de educação e promoção da saúde, e reinventar o próprio trabalho de atenção à população. As equipes e a coordenação municipal NASF ajudaram as equipes ESF no planejamento das ações, a na discussão de casos em andamento. Em Maceió (AL), as equipes NASF apoiaram na articulação com a rede de serviços de saúde e intersetorial. Em Salvador (BA), a equipe NASF de Vista Alegre auxiliou no desenvolvimento do fluxo do atendimento da unidade.

Turnos

Em Recife (PE) estabeleceram turnos para equipes inteiras, tanto nas unidades de referência, quanto remotos para telemonitoramento. A reorganização do trabalho das equipes NASF e da APS mesma, incluindo a garantia de equipamento de proteção individual (EPI) para profissionais trabalhando nas unidades de saúde, permitiu a manutenção das ações individuais, quando extremamente necessárias, marcadas em horário fixo e em local com ventilação.

Comunicação continuada com usuários

Para compensar a suspensão dos grupos, todas as experiências NASF relatadas trouxeram a utilização de grupos de WhatsApp, utilizados para enviar mensagens e vídeos, e de ligações por telefone para manter contato com os usuários. O que auxilio às equipes NASF de Recife (PE) no estabelecimento de um vínculo remoto com pacientes que já eram atendidos, e permitiu dar continuidade aos grupos de educação em saúde via WhatsApp. Em particular, o NASF de Governador Valadares (MG) conseguiu acompanhar os usuários idosos, mais afetados e isolados neste período difícil. Outros grupos prioritários de seguimento apontados pelo NASF de Nova Lima (MG) foram os usuários com doenças crônicas, as gestantes, puérperas, e recém-nascidos, os pacientes agudos para reabilitação, e os socialmente vulneráveis, em conjunto ao Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). O meio foi priorizado também na Unidade Jardim Itu do SSC/GHC, Porto Alegre (RS), para evitar ao máximo possível as visitas domiciliares, pelo risco que isto significaria para os trabalhadores e para a população. Através dele fazem o primeiro contato com as famílias já identificadas como de maior vulnerabilidade, que precisem da intervenção da psicologia ou do serviço social.

Manutenção de atendimentos mais urgentes e campanha vacinal

Entre as experiências relatadas houve uma variabilidade nos protocolos para identificar quais atendimentos individuais e domiciliais realizar, considerando a necessidade da urgência. Em Salvador (BA), a equipe NASF de Vista Alegre optou por prover atendimentos individuais de suporte psicológico, nutrição e fisioterapia às demandas espontâneas. Porém, organizaram-se também para prover o teleatendimento nutricional a pacientes acompanhados pelas equipes. Por outro lado, a equipe NASF de Garcia/Federação, escolheu desempenhar avaliações de risco no sentido de custo-benefício, junto a usuários e equipes, para identificar quais pessoas tem certo risco e necessidades graves onde não daria para recuar o cuidado – por exemplo casos de violência doméstica. Esta equipe também passou a participar muito de atendimentos conjuntos com medicas e enfermeiras, havendo surgido muitos casos novos de sofrimento emocional e vulnerabilidade social. Adicionalmente, as equipes NASF apoiaram na campanha vacinal, tanto em Maceió (AL), quanto em Vista Alegre, Salvador (BA). Neste último caso, organizou-se a distribuição da caderneta do idoso e orientações sobre seu uso, e planejou-se o fluxo de atendimento da campanha de vacina em conjunto com a APS.

Atividades NASF no cuidado dos profissionais de saúde

A partir da preocupação com as potenciais causas de estresse e ansiedade para os profissionais de saúde – como o intenso trabalho, os riscos de contaminação durante um atendimento ou mesmo a contaminação da família ao retornar para casa, a falta de equipamentos e outras condições de trabalho -, as equipes NASF tomaram várias iniciativas para cuidar da saúde mental dos colegas. Em Governador Valadares (MG), a equipe NASF montou um projeto em parceria com o Centro Regional de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) e a Casa do Servidor. O projeto é voltado para a promoção do bem-estar físico e emocional dos servidores, e dos trabalhadores de saúde dos centros e hospitais da rede particular, conveniados ou não aos SUS. Tem o objetivo de minimizar o impacto que a pandemia do Coronavírus vem gerando no ambiente de trabalho, no intuito de auxiliar os servidores no enfrentamento deste momento de tensão e muita responsabilidade. Através deste projeto estão se ofertando aos trabalhadores de saúde atendimentos com psicólogos, fisioterapeutas, e instrutores de yoga, ginástica laboral, alongamento, pilates e auriculoterapia, com ações dentro do Hospital Municipal e nas unidades da ESF. Os implementadores relataram que o projeto está tendo uma boa adesão, especialmente nas unidades ESF. As equipes NASF de Maceió (AL), de Vista Alegre, em Salvador (BA), e de Recife (PE) também realizaram ações para a saúde mental dos profissionais. Estes últimos, em particular, estão provisionando escutas individuais presenciais e remotas aos profissionais de saúde que necessitem de suporte psicológico.

A equipe NASF de Garcia/Federação, em Salvador (BA), apontou para o incremento de problemas de saúde mental dos profissionais de saúde devidos ao contexto social e político extremamente vulnerável, e em parte por estar tão em contato direto com a vulnerabilidade social. Com as mudanças nos processos de trabalho, algumas coisas que antes passavam desapercebidas agora parecem mais graves, explicaram. Decidiram então elaborar um questionário de levantamento de demandas de sofrimento dos profissionais, para pensar coletivamente esse processo de apoio mútuo. O questionário desembocou em uma ação, o projeto “Partiu”, que alternou semanas temáticas de cuidado: uma de ação lúdica, outra de autocuidado, a seguinte de relaxamento, etc. Durante as sessões observam-se todos os cuidados necessários para prevenir o contágio: 2 metros de distância entre as pessoas e a utilização de máscaras.

Em dois lugares as equipes NASF ofereceram apoio para os colegas grupal e individualmente. Em Vista Alegre, Salvador (BA), o atendimento individual incluiu suporte emocional, fisioterapeuta com práticas integrativas, como acupuntura, auriculoterapia, e Liang Gong, e atendimento nutricional de fitoterapia. Algumas das ações de acolhimento nas unidades são oferecidas antes dos atendimentos para diminuição da ansiedade e integração da equipe. Por outro lado, em Recife (PE), o NASF proveu suporte da equipe de fonoaudiologia, e terapia ocupacional e nutricional para profissionais pós-COVID-19.

Em Jaboatão dos Guararapes (PE), houve a disponibilização de teleatendimento com a nutricionista objetivando minimizar o impacto de comorbidades (HAS/DIA/obesidade) e com psicóloga para suporte emocional em virtude da pandemia e dos impactos por ela provocados nas subjetividades.

Enquanto ao apoio grupal, a equipe NASF de Vista Alegre criou um grupo em uma das unidades acompanhadas, voltado para mudança de hábitos de vida, redução de angústia e integração da equipe. As atividades incluem encontros online via aplicativo ZOOM, e gravações de vídeos com orientações de exercício para serem praticados nos domicílios. Em Recife, os profissionais de saúde receberam cuidado através de apresentações musicais dos colegas NASF.

Finalmente, a equipe de Vista Alegre (BA) realizou apoio técnico através do matriciamento das equipes ESF sobre notas técnicas da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), CEREST e sobre o auxílio emergencial em reuniões de equipe de maneira periódica.

Dificuldades em tempos de pandemia

Todas as experiências ressaltaram as dificuldades encontradas pelos profissionais NASF durante o enfrentamento da pandemia de COVID-19. Apontaram para o custo de ter que se adaptar às mudanças nos processos de trabalho, ter que conceber como superar obstáculos no meio do medo e incertezas. Ressaltaram também quão complicado é gerenciar os residentes e estudantes presentes nas unidades, tentando apoiar formação quando nem eles sabem o que precisa ser feito. Também indicaram que em alguns casos os trabalhadores estão contribuindo financeiramente para a resposta à pandemia, por exemplo utilizando o próprio celular privado para realizar telemonitoramento e teleatendimento, e a importância de responsabilizar as SMS para que apoiem esses esforços. Além disso, relataram que a invisibilidade do trabalho pelo telefone está levando a sérias sobrecargas para os profissionais, inclusive fora dos horários de trabalho. Finalmente, destacaram as dificuldades, por parte dos profissionais das eSF e usuários, na utilização das ferramentas tecnológicas para realização das reuniões e teleatendimento para monitoramento; o limitado alcance para a comunidade, em alguns locais, do material divulgado nas mídias sociais; além da dificuldade com a qualidade da rede de internet e/ou telefônica, tanto dos usuários quanto dos profissionais, durante os atendimentos e reuniões remotas.

Considerações finais

A riqueza de experiências de atuação NASF que apareceram aponta para a possibilidade deste componente do sistema sanitário de contribuir para o enfrentamento da crise trazida pela pandemia de COVID-19, no fortalecimento da APS e no cuidado da população. Ademais, é perceptível que muitas experiências são semelhantes entre si, obviamente com suas especificidades locais, o que indica que as expertises das eNASF foram mobilizadas tanto para as atividades desenvolvidas na APS quanto para os próprios profissionais de saúde. Desafios também foram pontuados e servem de alerta para o aprimoramento e valorização das atividades realizadas por essas equipes na APS.

Abaixo apresentamos links e documentos compartilhados pelos relatores, esperando que contribuam para inspirar a atuação NASF no pais inteiro.

Agradecemos todos os que contribuíram com as experiências dos seus municípios e/ou equipes. As informações foram coletadas através de comunicação pessoal por e-mail em todos os casos, menos o da equipe de Garcia/Federação em Salvador (BA), cuja experiência foi apresentada em Live Instagram na página do @PRONASF, no dia 14 de maio 2020.

Links e documentos

Coordenação municipal NASF Governador Valadares – MG:

Unidade Jardim Itu do SSC/GHC, Porto Alegre – RS

Equipe NASF Garcia/Federação, Salvador – BA

Coordenação municipal NASF de Maceió – AL

Coordenação municipal NASF de Recife – PE

 

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde – Gabinete do Ministro. PORTARIA Nº 154, DE 24 DE JANEIRO DE 2008: Cria os Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF. Acesso em 02 jun 2020. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2008/prt0154_24_01_2008.html

BRASIL. Ministério da Saúde – Gabinete do Ministro. PORTARIA Nº 2.488, DE 21 DE OUTUBRO DE 2011: Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Acesso em 02 jun 2020. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt2488_21_10_2011.html

BRASIL. Ministério da Saúde – Gabinete do Ministro. PORTARIA Nº 3.124, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2012: Redefine os parâmetros de vinculação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) Modalidades 1 e 2 às Equipes Saúde da Família e/ou Equipes de Atenção Básica para populações específicas, cria a Modalidade NASF 3, e dá outras providências. Acesso em 02 jun 2020. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt3124_28_12_2012.html

BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A Atenção Primária e as Redes de Atenção à Saúde / Conselho Nacional de Secretários de Saúde. – Brasília: CONASS, 2015. 127 p. ISBN 978-85-8071-024-3 Acesso em 02  June  2020.  Disponível em:   https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf

BRASIL. Ministério da Saúde – Gabinete do Ministro. PORTARIA Nº 2.436, DE 21 DE SETEMBRO DE 2017: Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Acesso em 02  June  2020.  Disponível em:  https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html

BRASIL. Ministério da Saúde – Gabinete do Ministro. PORTARIA Nº 2.979, DE 12 DE NOVEMBRO DE 2019: Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-2.979-de-12-de-novembro-de-2019-227652180

BRASIL. CONASS & CONASEMS. Guia Orientador para o enfrentamento da pandemia Covid-19 na Rede de Atenção à Saúde. Brasilia: Maio 2020. Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em: http://www.conass.org.br/wp-content/uploads/2020/05/Instrumento-Orientador-Conass-Conasems.pdf

BROCARDO, Deniclara et al . Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf): panorama nacional a partir de dados do PMAQ. Saúde debate,  Rio de Janeiro ,  v. 42, n. spe1, p. 130-144,  set.  2018 .   Acesso em 02  June  2020.  Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042018000500130&lng=pt&nrm=iso

FONSECA, DdL. Morbidity and mortality in Brazil. Cad. saúde colet.,  Rio de Janeiro ,  v. 23, n. 1, p. 01,  Mar.  2015 .   Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/1414-462X201500010001.

MASSUDA A. Mudanças no financiamento da Atenção Primária à Saúde no Sistema de Saúde Brasileiro: avanço ou retrocesso? Ciência & Saúde Coletiva, 25(4):1181-1188, 2020. Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/csc/v25n4/1413-8123-csc-25-04-1181.pdf

MELO EA, MENDONÇA MHM, OLIVEIRA JR, ANDRADE GCL. Mudanças na Política Nacional de Atenção Básica: entre retrocessos e desafios. SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 42, NÚMERO ESPECIAL 1, P. 38-51, SETEMBRO 2018. Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/sdeb/v42nspe1/0103-1104-sdeb-42-spe01-0038.pdf

MENDES, EV. As redes de atenção à saúde. / Eugênio Vilaça Mendes. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2011. 549 p.: il. ISBN: 978-85-7967-075-6 Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em:   http://repositorio.asces.edu.br/bitstream/123456789/1314/1/as%20Redes%20de%20Atencao%20a%20Saude_Eugenio_2ed.PDF

OMS. World Health Organization. Mental health and psychosocial considerations during the COVID-19 outbreak. Ginevra: 18 Março 2020. Acesso em 02  jun  2020.  Disponível em:  https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/mental-health-considerations.pdf?sfvrsn=6d3578af_2

 

Por Diana Ruiz e Valentina Martufí, doutorandas ISC/UFBA que contribuem para a REDE APS.