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Arquivo Mensal abril 2021

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil – Capítulo sobre Atenção Primária

Atenção primária refere-se a um conjunto de práticas integrais em saúde, direcionadas a responder a necessidades individuais e coletivas, que, no Brasil, durante o processo de implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), passou a ser denominado de atenção básica à saúde. A atenção básica constitui a porta de entrada e o primeiro nível de atenção de uma rede hierarquizada e organizada em complexidade crescente, conforme definido na Constituição Federal de 1988, que criou o SUS.

Nos dias atuais, a atenção primária à saúde é considerada internacionalmente a base para um novo modelo assistencial de sistemas de saúde que tenham em seu centro o usuário-cidadão. Este capítulo apresenta um panorama internacional e brasileiro da atenção primária à saúde. Na primeira parte, discutem-se conceitos e abordagens de atenção primária à saúde e suas transformações ao longo do tempo, destacando-se os atributos de uma atenção primária abrangente, integral. Em seguida, apresentam-se, em perspectiva internacional, antecedentes históricos dos serviços de atenção primária e a experiência em países europeus com centralidade nos serviços prestados por médicos generalistas ou de família e comunidade. Na sequência, é analisada a trajetória histórica das políticas de atenção primária à saúde no Brasil, com realce para a Estratégia Saúde da Família e a Política Nacional de Atenção Básica. Traça-se então um panorama da oferta e da prestação de serviços de atenção básica no Brasil e, no final, discutem-se os desafios para a consolidação do SUS como um sistema de saúde orientado pela atenção primária à saúde.

Leia capítulo completo elaborado pelas autoras Lígia Giovanella e Maria Helena Mendonça

cap16 APS Giovanella Mendonca

Vacina é no SUS: na APS ! Participe do 1 Seminário 2021 com o tema Os desafios da Vacinação contra Covid-19 na APS no SUS -27/04

O acesso rápido à vacinação contra Covid-19, uma das mais importantes medidas para o controle da pandemia é um desafio global, mas no Brasil,  tornou-se ainda mais difícil em decorrência do negacionismo do governo federal e sua estratégia político institucional deliberada, com empenho na ação da União em favor da ampla disseminação do vírus no território nacional, deixando a população morrer até alcançar a imunidade de rebanho, com o objetivo de retomar a atividade econômica o mais rápido possível e a qualquer custo, com constantes entraves às respostas locais (Asano et al, 2021).

Os desafios globais são muitos em face às grandes disparidades entre o Norte e o Sul globais no acesso às vacinas Covid-19, à escassez no mercado mundial de matérias-primas, as grandes encomendas dos países ricos que excedem, em muito, suas necessidades populacionais, concentram as indústrias farmacêuticas, proíbem a exportação de vacinas produzidas em seus países e não transferem tecnologia (Corrêa F, Ribeiro 2021). Essas dificuldades são preocupantes, não apenas desde uma perspectiva ética e de justiça social, mas também porque a falta de acesso oportuno às vacinas prolongará ainda mais a pandemia e aumenta o risco de surgimento de novas cepas do vírus contra as quais as vacinas aprovadas podem não ser eficazes (Wouters et al., 2021).

Além desses problemas globais, o governo brasileiro, em meados de 2020, se recusou a negociar / comprar vacinas produzidas pelo Instituto Butantan de São Paulo e empresa chinesa Sinovac, e negou as ofertas de compra das empresas Pfizer e Jansen. Inicialmente, anunciou que não participaria do Covax Facility, a aliança global coordenada pela OMS para distribuir imunizantes a países de baixa e média renda (WHO, 2020) e, posteriormente, não aceitou todas as vacinas a que teria direito na Aliança. Ainda mais grave, o governo brasileiro votou contra a proposta da Índia e da África do Sul na OMC de suspender as patentes de vacinas, medicamentos e suprimentos hospitalares para combater a Covid-19 durante a pandemia. Esta decisão permitiria ampliar muito a produção mundial de vacinas, facilitando o acesso. O Brasil é o único país que se opõe à esta iniciativa entre as nações de baixa e média renda.

Atualmente, abril de 2021, temos no Brasil vacinas em produção no país, Coronavac Butantan e Oxford / Astrazeneca / Fiocruz, com proposição de transferência de tecnologia, mas ainda dependentes de insumos farmacêuticos da China, com atrasos frequentes.

Além dessa baixa disponibilidade de vacinas contra Covid-19, no país, o plano nacional de imunização demorou a ser elaborado, está incompleto e não há definição clara dos grupos prioritários com inclusão constante de novos grupos por pressão da clientela política do governo federal.

Soma-se a estes descalabros, por proposição do presidente da câmara federal e pressão de empresários governistas de extrema direita com consentimento do Ministério da Saúde, projeto já aprovado na Câmara dos Deputados que permite a compra de vacinas contra Covid-19 por empresas privadas com a finalidade estrita de imunizar seus empregados e familiares. E gravíssimo: o projeto permite e compra pelo setor privado de vacinas sem avaliação e autorização da ANVISA. A compra da vacina contra Covid-19 pelo setor privado fere os princípios constitucionais do direito universal e igualitário à saúde. Objetiva privilegiar mais uma vez os mais privilegiados, em detrimento da maioria da população, aprofundando ainda mais as desigualdades no acesso à saúde.

Vacina é no SUS: na APS! A capacidade da APS de imunização rápida da população seria enorme, não fosse o negacionismo do governo nacional que obstaculiza o acesso às vacinas. Mais de 37 mil unidades básicas de saúde oferecem vacinação de rotina, possuem geladeiras exclusivas para vacinas, têm pessoal com experiência em imunização e estão participando da vacinação contra Covid-19. Com esta infraestrutura capilarizada em todo o país, o SUS teria capacidade de imunizar até 2 milhões de pessoas por dia! No entanto, o processo de vacinação tem sido muito lento devido à baixa disponibilidade e distribuição de vacinas no país. Ainda assim, até 20 de abril foram aplicadas mais de 33 milhões de doses de vacina anti-Covid -19.

A vacinação pelas equipes de APS requer organização da UBS para vacinação; treinamento específico já que são utilizadas diferentes vacinas, com diferentes formas de aplicação e período para a segunda dose; registro adequado na caderneta de vacinação; cadastro de vacinados em sistemas de informação; e estratégias de vigilância e monitoramento de possíveis efeitos adversos. Para debater e informar sobre estes temas, a Rede de Pesquisa em APS da Abrasco está organizando o seminário:

Os desafios da Vacinação contra Covid-19 na Atenção Primária à Saúde no SUS  que acontecerá no dia  27 de abril das 9h às 12h

Transmitido pelo YOUTUBE TV ABRASCO

https://youtu.be/uoUUgZ5kpMA

OPAS e CNS lançam o Laboratório de Inovação para selecionar Experiências do Controle Social contra a COVID-19

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) no Brasil e o Conselho Nacional de Saúde (CNS) abriram no dia 15/04   as inscrições para o Laboratório de Inovação – Conselhos de Saúde e Participação Social na resposta à Covid-19. Podem participar experiências desenvolvidas por conselhos estaduais, municipais e locais de saúde, por universidades e instituições de ensino superior, e por atores de setores diversos segmentos (Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público, organizações filantrópicas ou sociedade civil). As inscrições podem ser feitas no Portal da Inovação na Gestão do SUS (https://apsredes.org/participacao-social-na-resposta-a-covid-19) até o dia 15 de maio. 

Cada experiência precisa contemplar um dos três eixos temáticos: 

  1. Fortalecimento e qualificação da participação social dos Conselhos de Saúde visando exercer o controle social na proposição, fiscalização e controle das ações governamentais de enfrentamento da pandemia. 
  2. Atuação direta dos Conselhos de Saúde em ações de comunicação para a população, mobilização e articulação social para o enfrentamento da pandemia.
  3. Parcerias dos Conselhos de Saúde com cursos de graduação da área da saúde, Universidades e Instituições de Ensino Superior promovendo a integração do ensino com a participação social.

Os conselhos e eventuais instituições parceiras que tiverem experiências selecionadas receberão um certificado de reconhecimento, participarão de debates virtuais e vão ter a prática sistematizada e divulgada em publicação organizada pelo CNS e OPAS/OMS, por meio da Série NavegadorSUS. 

As experiências devem ser de ações formalizadas e respaldadas por um Conselho de Saúde, local, municipal ou estadual. 

O Laboratório de Inovação – Controle de Saúde e Participação Social na resposta à Covid-19 busca inovações com enfoque na promoção da saúde, na integração das universidades e institutos de Ensino Superior com os Conselhos de Saúde e nas ações de proteção social de populações vulnerabilizadas no contexto da pandemia.

A iniciativa também consolidará em um acervo todas as experiências selecionadas, visando subsidiar as etapas de intercâmbio entre os participantes da iniciativa. A metodologia do Laboratório de Inovação em Saúde (LIS) foi desenvolvida pela OPAS/OMS Brasil, em 2008, para agregar uma nova ferramenta nas atividades de cooperação técnica a partir da compreensão de que diversas inovações são produzidas no SUS. A parceria com o Conselho Nacional de Saúde ocorre desde 2011.

Para inscrição, acesse o site – https://apsredes.org/participacao-social-na-resposta-a-covid-19

Confira o cronograma:

Edital e inscrições no site www.apsredes.org: 15/04 a 15/05/21

Seleção das experiências: 15/05 a 16/06/21

Fase de intercâmbio de experiências: 16/6 a 31/10/21

Finalização do Laboratório: mês de novembro.

  • Leia sobre o lançamento do Laboratório clicando aqui 

APS em Revista disponível primeira edição de 2021

A APS em Revista disponibiliza para a comunidade cientifica e profissional seu primeiro número de 2021, em meio ao aprofundamento da maior crise sanitária da história brasileira. Com reflexos diretos na
oferta dos serviços de saúde e na capacidade de resposta dos agentes ligados a esta dramática situação, o crescimento quase exponencial do número de óbitos e o colapso iminente na oferta dos serviços causa tristeza, espanto e perplexidade. Isso fez com que este número apresentasse dois grandes blocos de artigos.
 
No primeiro deles, guardando estreita articulação às necessidades de compreensão do papel da APS no
enfrentamento da pandemia em suas múltiplas dimensões, a Editoria Cientifica fortalece o papel da
APS em Revista ao promover a divulgação de quatro experiências nacionais e internacionais que abordam a pandemia da COVID- 19.
 
O segundo bloco, por sua vez, traz quatro artigos que abordam a APS sem o foco direcionado à pandemia, mas permitem uma forte reflexão acerca do seu papel no sistema de saúde. Fechando este número, a seção Debates e Discussões traz um conjunto de evidências sobre financiamento e equidade na APS.
 
Com efeito, o primeiro artigo traz a descrição da vivência da prática do acolhimento na Atenção Primária à Saúde durante a pandemia COVID-19 em um Centro de Saúde de São Luís, Maranhão.
 
O artigo seguinte apresenta ações e estratégias desenvolvidas pela Atenção Primária à Saúde para o enfrentamento da pandemia do COVID- 19 em Jari, Rio Grande do Sul.
 
O terceiro artigo deste número, uma contribuição internacional, apresenta como foi a resposta à pandemia da Covid- 19 em Cuba.
 
Fechando este primeiro bloco, o quarto artigo analisa os desafios para o enfrentamento da pandemia a partir da vivência em hospital de caráter regional de Belo Horizonte e a necessidade da ampliação de estratégias junto à Atenção Básica para a continuidade do cuidado.
 
Abrindo o segundo bloco, o quinto artigo apresenta relato da experiência de capacitação de profissionais da APS para inserção do DIU de cobre.
 
O sexto artigo traz a discussão e identificação dos principais problemas bioéticos na Estratégia Saúde da Família na perspectiva dos Agentes Comunitários de Saúde de Magé, Rio de Janeiro.
 
Na sequência, o sétimo artigo discute a busca por uma maior eficiência dos sistemas e saúde através da análise das relações existentes entre Hospitais com menos de 50 leitos e a Atenção Primária à Saúde no SUS.
 
O oitavo artigo descreve o perfil da demanda de Unidades Básicas de Saúde (UBS) em Pelotas, Rio Grande
Sul, e seu potencial de extrapolação de resultados para o município como um todo e para outros de porte similar ao estudado.
 
Finalizando esta edição e como artigo convidado da seção Debates e Discussões, é apresentada
uma análise da evolução dos gastos municipais e da equidade no financiamento municipal da saúde no Brasil entre 1998- 2018, evidenciando um avanço na equidade coincidente com a introdução do Piso da Atenção Básica (PAB) e Emenda Constitucional 29 do ano 2000.
 
Dedicamos este número a todos e todas que perderam suas vidas no combate a esta pandemia e solidarizamos com familiares, amigos e profissionais de saúde que atuam na linha de frente para preservar vidas.
Assista o vídeo da APS em Revista 
 
 

1 Seminário 2021 Rede APS: Os desafios da Vacinação Contra a Covid-19 na Atenção Primária à Saúde no SUS

A Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde , durante esta dramática pandemia, tem buscado contribuir com conhecimentos e propostas de reorganização e atuação da APS no SUS para o enfrentamento da pandemia, garantindo acesso e assistência à saúde para a população brasileira.

Neste sentido organizaremos o 1 Seminário 2021 da Rede APS que terá como tema: Os desafios da Vacinação Contra a Covid-19 na Atenção Primária à Saúde no SUS. O encontro acontecerá no dia 27 de abril, das 9h às 12h e será transmitido pelo YOUTUBE TV ABRASCO no link https://youtu.be/uoUUgZ5kpMA

 

 

Equidade no acesso às vacinas contra a Covid-19

Para controlar a pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2 precisamos garantir o acesso universal oportuno a vacinas contra a Covid-19 em todos os locais do mundo, junto com os insumos e a logística necessários para sua aplicação.

Para alcançar esse objetivo é necessário aumentar o volume e a velocidade da produção, garantir preços acessíveis para a sua distribuição e fortalecer o sistema logístico (armazenamento, transporte, cadeia do frio, profissionais de saúde dedicados). No entanto, estão se apresentando diversas dificuldades como escassez de matérias primas e grandes encomendas feitas pelos países ricos junto com proibições de exportação (OMS, 2021; Wouters et al., 2021). Essas dificuldades de acesso global preocupam não somente por uma perspectiva ética e de justiça social, também porque a falta de acesso oportuno às vacinas pode prolongar a pandemia ainda mais e aumentar o risco de surgimento de novas cepas do vírus contra as quais as vacinas aprovadas poderiam ou não ter eficácia (Wouters et al., 2021)

Com o objetivo de evitar o acesso desigual às vacinas em abril de 2020, a OMS anunciou a conformação da estratégia Covax. Esta última é uma iniciativa que reúne governos, organizações globais de saúde, produtores, cientistas, setor privado, sociedade civil e filantropia, com a finalidade que os países tenham acesso equitativo a métodos diagnósticos, tratamentos e vacinas contra a COVID-19. O mecanismo Covax apoia pesquisas, desenvolvimento e fabricação de diferentes vacinas, além da compra conjunta dos imunobiológicos para negociar preços baixos. (Berkley, 2020). Por meio dessa plataforma as doses de vacinas serão alocadas aos países participantes proporcionalmente ao tamanho da sua população, até que cada país receba as doses para vacinar 20% da sua população. Nesse momento, se realizaria um acompanhamento para expandir a cobertura a outras populações (OMS, 2020). A meta é ter 2 bilhões de doses disponíveis pelo mecanismo Covax até final de 2021 (Berkley, 2020).

O sucesso do mecanismo Covax depende do financiamento para a compra de vacinas. Em fevereiro de 2021 governos e outros parceiros aportaram cerca de US $ 4 bilhões, mas segundo a GAVI e a OMS seriam necessários mais US $ 6,8 bilhões para alcançar a meta (2 bilhões de doses até final de 2021). (Wouters et al., 2021)

Outro desafio que têm que afrontar esse mecanismo é que muitos países (inicialmente os de alta renda) preferiram não comprar as vacinas através de Covax, limitando-se a estabelecer acordos de compra antecipada com os desenvolvedores de vacinas para ter acesso prioritário a grandes quantidades para inocular a maioria ou toda a população adulta do país em 2021. O que significaria que grande parte da população desses países estaria imunizada incluso antes de que profissionais de saúde e populações de alto risco recebam a vacina em países mais pobres. Governos de países de alta renda (que representam 16% da população global) fecharam pré-encomendas de, pelo menos, 4,2 bilhões de doses de vacinas. Quanto mais países adquirem as doses de maneira independente com os desenvolvedores, aumentam as preocupações com o fornecimento pela Covax o que têm estimulado outros países a adquirir doses também fora desse mecanismo. Até 3 de fevereiro de 2021 pelo menos 62 países ou blocos de países tinham fechado acordos de compra diretamente. Alguns países (EEUU, RU) e regiões (União Europeia) encomendaram quantidades de vacinas superiores as suas necessidades, abrindo a questão de qual será o destino desses eventuais excessos, uma vez que estes países alcançarem suas metas.  No entanto, a maioria dos países não podem comprar por conta própria e dependem do mecanismo Covax para ter acesso às vacinas (Wouters et al., 2021).

Em alguns países (Brasil, Itália, outros) foram observadas tentativas de compra de vacinas contra a Covid-19 por parte de governos subnacionais, complicando mais ainda a situação, com o risco de criar desigualdades entre cidadãos do mesmo país.

Alguns autores criticam a alocação proporcional por população do país proposta no mecanismo Covax, considerando que as vacinas Covid-19 deveriam ser distribuídas equitativamente priorizando os países mais afetados pela pandemia e de baixa e média renda, como o Brasil, onde o potencial de redução de danos seria muito maior. (Herzog, et al. 2021)

Até o dia 15 de março de 2021 a Covax tinha distribuído a 46 países mais de 29 milhões de doses (GAVI, 2021). Com esse panorama é pouco provável que a meta de 2 bilhões de doses alocadas em 2021  seja alcançada (Wouters et al., 2021).

Além do mecanismo Covax, outras estratégias vêm sendo sugeridas para superar as dificuldades para o acesso equitativo e justo às vacinas contra a Covid-19. No entanto, nenhuma delas até agora teve maiores avanços. Na Organização Mundial do Comércio (OMC) a proposta de suspensão temporária de patentes para a Covid-19 apresentada pela Índia e Sudáfrica e respaldada por 99 países como Quênia,  Moçambique, Paquistão, Bolívia,  Venezuela,  Mongólia, Zimbábue, Egito,  grupo africano e grupo dos países menos desenvolvidos e também a OMS e 379 ONG, já tem sido apresentada e negada seis vezes. (OMC, 2021; OMS, 2021; Carta de la Sociedad Civil, [2020]).

Segundo o portal  Outra Saúde (2021) para que a proposta seja aprovada precisaria do consenso dos 164 países membros, mas nações ricas como Japão, Canadá, Estados Unidos, a União Europeia e alguns outros países como o Brasil e a Colômbia não têm votado a favor.

Além disso, a OMS está propondo várias abordagens: processos de acordo entre quem desenvolveu as vacinas e outros fabricantes farmacêuticos com maior capacidade de produção; processos de transferência tecnológica bilateral  voluntária entre a empresa que detém as patentes da vacina e outra empresa que pode produzi-las; transferência coordenada de tecnologia envolvendo universidades, produtores de vacinas, outras empresas produtoras e coordenação da OMS, o que faria o processo mais transparente e poderia potencialmente funcionar para a produção de vacinas de rotina ou em outras pandemias (OMS, 2021. Mas, ainda não sabemos se isso vai acontecer.

Além dessas problemáticas, recentemente parece estar aumentando o interesse e as possibilidades para que o setor privado faça compra de vacinas, o que poderia afetar a equidade. Empresas privadas poderiam comprar as vacinas e vendê-las ao público ou oferecê-las gratuitamente a seus empregados. Isso poderia reduzir a carga de custos para os governos que poderiam investir os fundos governamentais unicamente nos mais necessitados. Porém, o risco desse tipo propostas é quebrar o princípio da equidade: se as empresas oferecem as vacinas fora do calendário de prioridades de vacinação estabelecido pelos governos, as pessoas mais ricas seriam vacinadas antes que os vulneráveis. Além disso, os preços das vacinas poderiam subir, os fabricantes poderiam dar prioridade aos melhores compradores do setor privado e poderia aumentar o risco de fraude e mercado paralelo ilegal de vacinas. (Launch & Scale Speedometer, 2021).

Os desafios para alcançar a vacinação para todos nos países mais pobres não se limitam as restrições financeiras relativas à compra das doses de vacinas para toda a população mas, envolvem também, problemas logísticos devidos à fragilidade dos sistemas de saúde desses países e a existência de muitas regiões com difícil acesso ou em situação de guerra ou conflitos sociais graves. Funções básicas como armazenagem, transporte, cadeia do frio, disponibilidade de profissionais etc. podem apresentar dificuldades gigantescas para os países mais pobres.  Quando imunizantes de duas doses são utilizados, os desafios da universalidade da vacinação contra a Covid-19 nesses países aumentam, porque exigem também registros confiáveis e sistemas de chamadas efetivos para assegurar a segunda dose. Seria aconselhável que uma cota importante de doses de imunizantes com subministração única seja reservada para territórios de grande vulnerabilidade.

Esta situação configura um panorama no qual parece pouco viável o acesso universal, justo e oportuno às vacinas contra a Covid-19, afetando em maior medida aos países menos desenvolvidos e, dentro desses países, as pessoas mais vulneráveis. Isso, além de ter gravíssimas consequências éticas em termos de vidas humanas perdidas, vai favorecer a circulação viral descontrolada em muitos territórios, aumentando o risco de variantes da Covid-19 resistentes às vacinas atualmente em uso. Para impedir que isso ocorra, parece indispensável um importante esforço da cooperação internacional, não apenas para a provisão do número suficiente de doses de vacinas, mas também para o apoio concreto e in loco das campanhas de imunização. 

É preciso que os países e diferentes organizações sociais, científicas e da sociedade civil unam-se para exigir vacinas para todos.  O acesso universal às vacinas contra a Covid-19 é um assunto social e de saúde pública global.

Por: Diana Ruiz, doutoranda que contribui com a Rede APS

Fonte: Launch & Scale Speedometer. 30 março 2021 https://launchandscalefaster.org/COVID-19

Referências

A outra Saúde. Nó mundial das patentes será desatado na pandemia? Outra Saúde 10 mar 2021 Disponível em: https://outraspalavras.net/outrasaude/nomundialdaspatentesseradesatadonapandemia/ Acesso: 12 mar 2021

Berkley Seth. Covax explained. Gavi The Vaccine Alliance. 3 set 2020. Disponível em: https://www.gavi.org/vaccineswork/covax-explained Acesso: 5 mar 2021

Carta de la Sociedad Civil. Apoyando la propuesta de India y Sudáfrica sobre la exención (waiver) de ciertas disposiciones del acuerdo sobre los ADPIC para la prevención, la contención y el tratamiento de la covid-19. [2020]. Disponível em: https://saludporderecho.org/wp-content/uploads/2020/10/CARTA-DE-LA-SOCIEDAD-CIVIL.pdf Acesso: 15 mar 2021

Herzog L., Norheim O., Emanuel E., et al. Covax must go beyond proportional allocation of covid vaccines to ensure fair and equitable. BMJ 2021;372:m4853 doi: https://doi.org/10.1136/bmj.m4853 Acesso: 5 mar 2021

GAVI The Vaccine Alliance. Covax vaccine roll-out. 15 mar 2021 Disponível em: https://www.gavi.org/covax-vaccine-roll-out Acesso: 16 mar 2021

Launch & Scale Speedometer. Covid-19 vaccines are flowing into the private sector. What does this mean for equity?.  Duke Global Health Innovation Center. Launch & Scale Speedometer. 9 mar 2021. Disponível em: https://launchandscalefaster.org/blog/covid-19-vaccines-are-flowing-private-sector-what-does-mean-equity Acesso: 10 mar 2021

OMC. Los Miembros examinan la solicitud de exención del Acuerdo sobre los ADPIC e intercambian opiniones sobre la función de la propiedad intelectual en un contexto de pandemia. Organización Mundial del Comercio OMC. 23 fev 2021. Disponível em: https://www.wto.org/spanish/news_s/news21_s/trip_23feb21_s.htm Acesso: 10 mar 2021

OMS. WHO Director-General’s opening remarks at the media briefing on COVID-19. OMS 5 Mar 2021. Disponível em: https://www.who.int/director-general/speeches/detail/who-director-general-s-opening-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19-5-march-2021 Acesso: 12 mar 2021

OMS. Fair allocation mechanism for COVID-19 vaccines through the COVAX Facility. OMS. 9 set 2020. Disponível em: https://www.who.int/publications/m/item/fair-allocation-mechanism-for-covid-19-vaccines-through-the-covax-facility Acesso: 1 mar 2021

Wouters O., Shalden K., Salcher-Konrad M., et al. Challenges in ensuring global access to COVID-19 vaccines: production, affordability, allocation, and deployment. The Lancet 2021:397;10278, P1023-1034. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(21)00306-8/fulltext Acesso: 15 mar 2021