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Arquivo Mensal agosto 2017

Revista Época – O governo quer mudar a atenção básica à saúde. Quais os efeitos?

Reportagem publicada na Revista ÉPOCA – 10/08/2017  cita o coordenador da Rede de Pesquisa APS/Abrasco e pesquisadora Ligia Giovanella integrante do comitê coordenador da Rede APS.

A proposta de revisão da Política Nacional de Atenção Básica prevê mudanças no programa Saúde da Família e no trabalho dos agentes de saúde – dois pontos em que o país se sai bem. Especialistas temem retrocessos

Em 2010, a prestigiosa revista científica britânica BMJ dedicou um de seus editoriais ao sistema de saúde brasileiro. O tom era elogioso. Ainda que reconhecesse problemas, a revista destacava a capacidade brasileira de, desde a criação do SUS, em 1988, universalizar o acesso à saúde e, com isso, melhorar indicadores importantes: como a mortalidade infantil (que caiu) e as taxas de vacinação (que cresceram). Chegava mesmo a uma conclusão ousada: “Os gestores britânicos têm o hábito de buscar nos EUA exemplos inovadores de cuidados em saúde”, dizia a revista. “Talvez eles devessem olhar para o Brasil.” Para a BMJ, o Brasil “acerta em muitos pontos”. Um desses acertos, dizia a revista, tinha sido a criação da Estratégia Saúde da Família (ESF).

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programa Saúde da Família, criado em 1994, foi alçado em 1998 a principal estratégia do governo brasileiro para ampliar e consolidar a atenção básica no país. A atenção básica é aquela que se encarrega da complexa missão de acompanhar a pessoa durante a saúde, de modo a evitar que doenças surjam ou se agravem. Funciona como a porta de entrada do sistema de saúde. A ideia do Saúde da Família era facilitar o acesso a esses cuidados. O programa divide a população do município em grupos, chamados territórios. E cada território passa a contar com uma equipe de profissionais formada por médico de família, enfermeiros e agentes de saúde – agentes que fazem visitas domiciliares para orientar a população sobre consultas, uso de remédios, prevenção de doenças, entre uma infinidade de outras questões. Idealmente, esse pessoal deve conhecer as condições de vida daquela população, para pensar maneiras de melhorar os cuidados que essas pessoas recebem. Maneiras de garantir que sejam mais saudáveis.

O ESF representou um avanço em relação ao modelo tradicional de atenção básica oferecido no Brasil até o começo dos anos 1990 (e que persiste em alguns municípios), em que a população visita uma Unidade Básica de Saúde (as UBS) para se consultar com um médico, sem garantia de acompanhamento próximo e constante. O Saúde da Família também emula experiências semelhantes já testadas no Canadá e no Reino Unido – dois países elogiados por seus sistemas de saúde exemplares. E que surtiram bons efeitos por lá. Desde 1994, o Saúde da Família se expandiu a ponto de, hoje, alcançar 64% da população brasileira. O sucesso foi, em parte, reflexo da posição de protagonista ocupada pelo programa, considerado uma estratégia prioritária para a atenção básica. Como é prioridade, ele garante repasses federais adicionais aos municípios que o implantam.

>>No Brasil, a conta da saúde fica com a prefeitura

Mas isso pode estar perto do fim. O Ministério da Saúde discute mudar a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB). É ela que reúne as diretrizes que orientam as ações dos governos federal, estaduais e municipais nessa seara. O novo texto, que esteve aberto a consulta pública até o último domingo (6), reconhece a existência de outros modelos da atenção básica, além do Saúde da Família – inclusive o modelo tradicional. Modelos que, caso a proposta seja aprovada, poderão receber financiamento federal, competindo com o ESF na disputa por recursos. “Num contexto de corte de gastos, como o que a gente vive no Brasil, isso pode significar menos investimento para uma estratégia que já se mostrou eficiente”, diz a professora Ligia Giovanella, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

>>Nos municípios pequenos, as pessoas sofrem mais com problemas de saúde evitáveis

A proposta do governo preocupa mais pelo que deixa de dizer do que por aquilo que expressa em suas pouco mais de 40 páginas. “Em muitos trechos, ela é enfática ao dizer que o Saúde da Família continua sendo a estratégia prioritária”, diz Thiago Trindade, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade (SBMFC). “Mas não explica como vai manter essa prioridade, agora que vai reconhecer outros modelos.” As mudanças, e a falta de definição do texto, preocuparam entidades de saúde. Em uma nota, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) criticou a proposta: “Embora a minuta da PNAB afirme ser a Saúde da Família estratégia prioritária para expansão e consolidação da Atenção Básica, o texto na prática rompe com sua centralidade na organização do SUS, instituindo financiamento específico para quaisquer outros modelos na atenção básica (para além daquelas populações específicas já definidas na atual PNAB como ribeirinhas, população de rua) que não contemplam a composição de equipes multiprofissionais com a presença de agentes comunitários de saúde”.

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Em uma entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira (10) oministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que, ao estimular outros modelos de atenção básica, o governo quer passar a financiar “o mundo real”: “Essa flexibilização na PNAB permite financiar formas de atendimento que já existem em diversos municípios brasileiros”, disse o ministro. “São equipes e serviços que não estão no padrão estabelecido pelo Saúde da Família. Vamos passar a financiar o mundo real”.

A proposta da nova política foi discutida em uma reunião do Conselho Nacional de Saúde na quarta-feira (9). Dali, segue para ser debatida na Comissão Intergestores Tripartite, um grupo que reúne representantes de gestores da saúde das esferas federal, estadual e municipal. Além dos possíveis desdobramentos para o Saúde da Família, outras duas mudanças chamam a atenção no novo texto da PNAB. Uma diz respeito ao trabalho dos agentes de saúde e dos agentes de controle de endemias. Outra estabelece uma carteira de serviços essenciais que deverão ser oferecidos pela atenção básica em todo o país. A seguir, ÉPOCA avalia o impacto dessas novidades.

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O que vai acontecer com o Saúde da Família

Para entender as possíveis mudanças, é importante entender como a atenção básica é financiada no Brasil. O financiamento do sistema de saúde é responsabilidade de todas as esferas de governo: federal, estadual e municipal. Para sustentar a atenção básica, o governo federal transfere aos municípios um valor fixo preestabelecido, determinado pelo tamanho da população: “É um valor baixo, R$ 24 por habitante por ano”, diz Lígia. É esse o Piso da Atenção Básica (PAB) fixo. Os municípios ainda podem receber repasses adicionais, desde que implantem equipes de Saúde da Família: é o PAB variável,cujo valor mais baixo gira em torno de R$ 7 mil a cada equipe de Saúde da Família existente do município. Esses recursos adicionais funcionam como um mecanismo de indução: por meio dele, o governo tenta estimular as prefeituras a aderir a um programa que, comprovadamente, traz resultados.

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Nos municípios em que foi implantado, o Saúde da Família foi acompanhado por melhoras nos indicadores de saúde da população: “Já se provou que essa estratégia promove equidade”, diz Luiz Facchini, professor da Universidade de Pelotas e coordenador da Rede de Pesquisa em Atenção Primária da Abrasco. “Os indicadores das áreas mais pobres se aproximam daqueles verificados em áreas mais ricas, quando há implantação do ESF”. Ao Saúde da Família, por exemplo, é creditada a redução no número de internações feitas para tratar doenças que poderiam ser evitadas por meio de estratégias de prevenção. É o controle da hipertensão que evita uma internação depois de um infarto, por exemplo. Esse benefício do programa foi percebido em municípios brasileiros de todos os portes.

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Apesar de ser a estratégia prioritária, o ESF não é o único modelo de atenção básica em funcionamento no país. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 10% dos brasileiros são atendidos por modelos alternativos. A proposta da nova PNAB reconhece esses modelos. A novidade é que ela propõe que essas equipes passem, também, a receber financiamento federal adicional. “O que o novo texto propõe é estimular esses modelos alternativos”, diz Marcelo Demarzo, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Isso é positivo porque permite pensar formas de alcançar populações para as quais o Saúde da Família não é o melhor programa.” Alguns críticos afirmam que o Saúde da Família não é o modelo mais adequado para todas as parcelas da população: “Ele funciona mal com a classe média, que tem baixa adesão ao programa”, diz Demarzo. “E tem piores resultados nos grandes centros urbanos, nas capitais mais ricas.” O impacto do ESF na queda de internações por condições sensíveis à atenção básica é menor, de fato, nas cidades com mais de 1 milhão de habitantes.

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A mudança pode se mostrar positiva. Mas há o temor de que, em lugar de incentivar a busca por formas mais eficientes de cuidar da população, o texto provoque retrocesso: “Antes da criação do Saúde da Família, já havia equipes de atenção básica em funcionamento no país. Mas elas seguiam outra lógica”, diz a professora Lígia Giovanella. Eram equipes que não incluíam agentes de saúde e cujos profissionais tinham cargas horários menores. Equipes que não tinham condições de conhecer como viviam os pacientes de que cuidavam – para tratar deles de maneira integral. É o “mundo real” de que fala o ministro Ricardo Barros. “Ainda há equipes desse gênero no país. Elas são mais baratas. E são essas equipes tradicionais que vão ganhar fôlego com a nova política”, diz Lígia.

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O texto também deixa no ar algumas indefinições. A proposta afirma que o ESF permanece como estratégia prioritária. Mas não esclarece que tipo de estímulo o programa vai receber de modo a  diferenciá-la dos demais modelos. “O financiamento diferenciado era o mecanismo de indução, e ele desapareceu”, diz Trindade, da SBMFC. “Dizer que a ESF continua prioritária não basta. É preciso dizer como ela será estimulada.”

O que muda no trabalho dos agentes de saúde e dos agentes de controle de endemias

A nova PNAB altera também a forma como são organizados os trabalhos desses dois profissionais. Há semelhanças entre eles – ambos lidam diretamente com a população, visitando casas e orientando sobre como prevenir doenças. A proposta do governo, agora, é incluir os agentes de controle de endemias nas equipes da atenção básica, de modo que trabalhem sob uma mesma coordenação. É uma novidade – na última versão da política, de 2011, o termo “controle de endemias” nem sequer aparece.  A ideia do governo, ao fazer isso, é estimular que o trabalho desses dois tipos de agentes seja feito de maneira integrada.

Os agentes comunitários de saúde fazem parte das equipes de atenção básica desde o início dos anos 1990. Tradicionalmente, eles são moradores das comunidades onde trabalham. A ideia é que sejam capazes de fazer uma ponte entre a população e o sistema de saúde. Cada agente de saúde é responsável por um território do município e pelas pessoas que vivem nele. Cabe a esses agentes visitar as casas periodicamente, para orientar sobre o comparecimento a consultas médicas, o uso de remédios e campanhas de vacinação, entre uma infinidade de outras responsabilidades. São atividades que têm impacto importante para a saúde da população. No final do ano passado, ÉPOCA acompanhou o trabalho desses agentes na cidade de Américo Brasiliense, no interior de São Paulo. Américo é um típica cidade pequena, que arrecada poucos impostos e tem recursos limitados para investir em saúde. Por lá, o trabalho desses agentes foi essencial para manter saudáveis pessoas como Alfredo de Oliveira – um senhor de 79 anos que sofreu três acidentes vasculares antes de a agente de saúde Aparecida Lima da Silva ensiná-lo a tomar, nos horários certos, os remédios que mantém sob controle sua hipertensão.

Esse modelo de trabalho, se a nova PNAB for aprovada, deve ser incorporado pelos agentes de controle de endemias. São eles os responsáveis por visitar as casas em busca de focos do mosquito da dengue, por exemplo. A proposta é que atuem nos mesmos territórios que os agentes de saúde e se responsabilizem pelas famílias que morem ali. Façam visitas periódicas e orientem a população sobre como evitar a proliferação de animais causadores de doenças. A princípio, é uma mudança boa: “Os dois agentes fazem um trabalho de vigilância em saúde”, diz Marcelo Demarzo, da Unifesp. “Agora, esses trabalhos serão articulados e organizados.”

Mas a proposta ainda esconde um possível problema. Ao reconhecer, e estimular, outros modelos de atenção básica que não o Saúde da Família, o texto dá fôlego a alternativas que não contemplam o trabalho dos agentes de saúde. “Se a proposta for aprovada, essa será uma categoria em extinção”, diz Facchini, da Abrasco.

Relação de ações e serviços essenciais . O que é isso?

A ideia, em princípio, é boa. Trata-se da criação de uma relação de serviços que devem ser oferecidos pela atenção básica em todo o país. É um esforço de padronização, já testado em algumas capitais brasileiras: “Esse modelo, de carteira de serviços, já funciona bem Curitiba e em Florianópolis”, diz Thiago Trindade, da Sociedade de Medicina da Família e Comunidade. Ele permite ao cidadão saber que pode frequentar qualquer Unidade Básica de Saúde (UBS) de sua cidade e ter acesso ao mesmo tipo de atendimento, aos mesmos tipos de exames. Também ajuda a definir qual a estrutura necessária para que médicos e enfermeiros trabalhem bem: “Há casos em que certos procedimentos não são realizados porque a UBS não tem estrutura”, diz Luiz Facchini. A criação de uma relação nacional pode evitar problemas como esses.

Mas o texto da proposta contém ainda um detalhe que preocupa. Ele fala na criação de duas listas. Uma, de serviços essenciais – aqueles que não podem faltar. Outra, de “padrões ampliados”  com serviços mais sofisticados. O detalhe preocupa porque pode servir de pretexto para que os municípios ofereçam somente os serviços mais básicos: “E a lista mínima se torne, na prática, a lista máxima”, diz Lígia Giovanella, da Fiocruz. As duas relações ainda não foram elaboradas e devem ser discutidas no futuro. Mas o que as entidades médicas argumentam é que essa divisão em duas listas é desnecessária e potencialmente danosa: “O melhor seria a criação de uma lista ampla de serviços”, diz Facchini. “Que garantisse ao cidadão saúde de qualidade.”

Conselho Nacional de Saúde – 61 Reunião Extraordinária e 296 Reunião Ordinária

De 09 a 11 de agosto das 9h às 17h na Fundação Oswaldo Cruz – Rio de Janeiro

SEMINÁRIO PNAB

Neste momento, cerca de mil pessoas estão reunidas no seminário sobre a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), realizado pelo CNS, na Fiocruz do Rio de Janeiro.

Assista ao vivo: www.datasus.gov.br/emtemporeal
(Transmissão apenas para internet explorer)

Assista ao vivo: www.datasus.gov.br/emtemporeal

Contribuições à minuta de aperfeiçoamento da Política podem ser enviadas até dia 10 de agosto.

Contribuições à minuta de aperfeiçoamento da Política podem ser enviadas até dia 10 de agosto.

O prazo para enviar contribuições ao texto que propõe a atualização da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) terminaria nesta segunda-feira (7/8). A Comissão Intergestores Tripartite (CIT) decidiu prorrogar até o dia 10 de agosto devido ao grande número de sugestões recebidas. Até ontem, mais de 5 mil mensagens foram enviadas pelo formulário online.

Ao longo de uma década, desde quando foi instituída em 2006, a PNAB tem sido um dos principais instrumentos de desenvolvimento e consolidação do SUS. Em 2015 iniciou-se um processo de debate com objetivo de pactuar um conjunto de atualizações com vistas a incorporar as inovações e experiências acumuladas nos últimos anos, todavia, preservando a essência e as diretrizes dos documentos anteriores de 2006 e 2011.

Além da necessidade de aprimorar as diretrizes da Política depois de 10 anos de vigência, os resultados observados nos dois primeiros ciclos do PMAQ, as informações registradas no sistema de informação e-SUS AB e as demandas dos gestores estaduais e municipais reforçam a necessidade de revisar pela segunda vez o modelo de atenção à saúde para que atenda à pluralidade do país.

Acesse a Consulta Pública pelo link: http://formsus.datasus.gov.br/site/formulario.php?id_aplicacao=33409&crypt=email

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CIT: Prorrogado o prazo até o dia 10/08/2017

Minuta de aperfeiçoamento da PNAB entra em Consulta Pública

Caminhos da revisão da Política Nacional de Atenção Básica

Nota da SBMFC sobre a revisão da PNAB

A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) vem por meio desta analisar criticamente e contribuir com a proposta de revisão da Política Nacional da Atenção Básica (PNAB).

Ressaltamos, antes de apontarmos as questões que pensamos ser essenciais para o avanço da Atenção Primária à Saúde (APS) no Brasil, que é importante contextualizar que a revisão da PNAB está sendo proposta em um contexto de extrema restrição financeira e de instabilidade política, o que pode trazer riscos de enfraquecimento de uma política pública consolidada, como é a Estratégia Saúde da Família (ESF), com consequente fragilização da APS, embora possa ser uma oportunidade se o intuito for de fato deixar o sistema de saúde mais custo-efetivo através de uma APS robusta e forte pensada como eixo estruturante do SUS. Porém, para que isso ocorra é preciso mais do que revisão de diretrizes da PNAB; é necessário que o MS acene também para o financiamento desta política, já que esse é o principal fator de indução e consolidação de uma política pública e isto não ocorreu na proposta apresentada, em especial no que concerne a indução do modelo ESF enquanto prioritário, devendo para tanto ter alocação de recursos específicos e superior ao modelo tradicional. Sem essa sinalização não parece que seja o momento oportuno para revisão de política pública tão importante. 

Confira a nota na íntegra 

 

Nota publicada no site da SBMFC – 

Súmulas executivas, evidências do Programa Mais Médicos

Plataforma de Conhecimento Programa Mais Médicos (PMM) – uma iniciativa conjunta da Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde, vinculada à Abrasco, e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) surge do reconhecimento da importância do PMM como uma política, complexa e abrangente, que se insere no processo histórico de construção do Sistema Único de Saúde (SUS). O PMM com suas múltiplas dimensões de potenciais impactos sobre o SUS e na saúde da população apresenta muitos desafios aos gestores. Seus avanços precisam ser analisados de acordo com os diferentes contextos nos quais o Programa se desenvolve, englobando realidades distintas desde todos os pontos de vista. A Plataforma PMM atenta a estes desafios, busca responder a necessidades do gestor de tomar decisão informada e com resultados efetivos na prática, e de contribuir para a transparência e a prestação de contas à cidadania.

A seção Olhar para a Gestão da Plataforma de Conhecimentos do PMM faz parte do esforço de fortalecimento da relação gestão e conhecimento científico. Deste modo estão sendo criadas SUMULAS EXECUTIVAS, EVIDENCIAS DO PMM como parte do fortalecimento do conhecimento e gestão em que se busca chamar atenção sobre aspectos do Programa MM que podem fazer a diferença para o gestor preocupado com a melhoria dos serviços de saúde. A Rede de Pesquisa APS convidou integrantes de seu comitê coordenador a escreverem sobre o tema. Serão ao todo 5 súmulas que serão enviadas entre os meses de agosto a dezembro.

Iniciamos com o artigo Programa Mais Médicos e Fortalecimento da Atenção Primária à Saúde: Aspectos Relacionados à Atração e Fixação de Profissionais Médicos que visa oferecer aos gestores evidências sobre atração e fixação dos médicos na atenção primária à saúde no Brasil na perspectiva do Programa Mais Médicos (PMM). Trata-se de material para subsidio de eventuais decisões no âmbito de políticas públicas de provimento profissional e comprova que o PMM cumpriu sua proposição inicial de provimento emergencial em áreas críticas de permanência e fixação de médicos, beneficiando parcela significativa da população brasileira.

Boa leitura!

Autores: Allan C.Q. Barbosa, Juliana Goulart e Thiago Rocha

Observatório de Recursos Humanos em Saúde da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, implantando em 2005,  permitiu a criação de um espaço voltado à reflexão, debate e proposição de estudos e pesquisas aplicados à gestão de recursos humanos e avaliação de políticas públicas em saúde,  tendo como espaço privilegiado a Atenção Primária. O conjunto de estudos e pesquisas desenvolvidos, com apoio de editais das principais agências de fomento e organismos internacionais,  além da parceria com diferentes atores públicos, consolidaram sua proposta de atuação  voltada à geração de informações, análises  e políticas e ações na esfera pública da saúde.

 

Súmula 1 – Súmula Executiva_Atração e Fixação (3)

Imprensa repercute Consulta Pública sobre revisão da Política Nacional de Atenção Básica

O jornal Bom Dia Brasil desta sexta-feira, 4 de agosto, falou sobre a ameaça de corte de verba do Saúde da Família. Em reportagem sobre a PNAB, a matéria chamou atenção para a consulta pública sobre revisão da PNAB que acaba na segunda-feira dia 7 de agosto. Como contribuição à Consulta Pública, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva emitiu ontem um parecer, ressaltando sua manifestação contra a revisão da Política Nacional de Atenção Básica. A Abrasco se manifesta pela manutenção da PNAB 2011 até a conclusão de discussão democrática e aprofundada por gestores, usuários, profissionais, representantes da sociedade civil organizada e todos os interessados no pleno desenvolvimento e aperfeiçoamento dos SUS, e não “a toque de caixa” nesse momento de severa restrição de financiamento das políticas públicas, de grande fragilidade institucional e de continuadas ameaças ao SUS universal, integral, democrático e de qualidade.

Saiba aqui como participar da Consulta Pública

Associações reagiram a uma proposta do governo de tirar recursos do Programa de Saúde da Família. O trabalho tem resultado comprovado na redução de doenças graves.
Especialistas estão preocupados com o destino do programa. Dizem que o dinheiro que hoje é aplicado exclusivamente no programa vai passar a ser usado, também, em outros tipos de atendimento. E isso pode resultar em um número menor de equipes e prejudicar os pacientes e o Sistema Único de Saúde.

Assista à reportagem completa aqui.

 

Nota Publicada site ABRASCO – https://www.abrasco.org.br

Parecer Abrasco para a Consulta Pública sobre a PNAB

Como contribuição à Consulta Pública para revisão da PNAB – Política Nacional de Atenção Básica, convocada pela Comissão Intergestores Tripartite – CIT, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva apresenta seu parecer, ressaltando sua manifestação contra a revisão da Política Nacional de Atenção Básica. A Abrasco se manifesta pela manutenção da PNAB 2011 até a conclusão de discussão democrática e aprofundada por gestores, usuários, profissionais, representantes da sociedade civil organizada e todos os interessados no pleno desenvolvimento e aperfeiçoamento dos SUS, e não “a toque de caixa” nesse momento de severa restrição de financiamento das políticas públicas, de grande fragilidade institucional e de continuadas ameaças ao SUS universal, integral, democrático e de qualidade.

Participe, as contribuições serão recebidas pela CIT até segunda-feira, 7 de agosto.

+ Acesse aqui a consulta pública da minuta na plataforma FormSUS

+ Acesse aqui a minuta produzida pelo Grupo de Trabalho da CIT

Sem desconsiderar as oportunidades de aperfeiçoamento das políticas públicas, e de aprofundamento das transformações no modelo assistencial do SUS, e reconhecendo a necessidade de permanentes adequações e ampliações da Atenção Básica para atender a particularidades loco-regionais, territoriais e populacionais que exigem novos recursos para financiar sua implementação, os indiscutíveis avanços promovidos por mais de 20 anos da Estratégia de Saúde da Família como orientadora da expansão e consolidação da Atenção Básica estruturante das redes de serviços, exige que qualquer reformulação seja precedida de analises técnico-científicas consubstanciadas e amplo debate nacional, que em muito ultrapassam o universo dos gestores representados na CIT, para garantir da preservação dos princípios e diretrizes do SUS de universalidade, integralidade, equidade e participação social.

O documento em consulta altera as diretrizes e normas para a organização da atenção básica, para a Estratégia Saúde da Família – ESF e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS. Nesse sentido, seu conteúdo é crucial para os caminhos da Atenção Primária no país e afeta diretamente gestores, profissionais e usuários do SUS.

Na minuta da nova PNAB divulgada após a reunião da Comissão Intergestores Tripartite – CIT, há alterações profundas referentes à organização e financiamento da Atenção Básica. Institui financiamento específico para quaisquer outros modelos na atenção básica, abrindo a possibilidade de financiar com o Piso de Atenção Básica Variável equipes tradicionais de Atenção Básica. Afeta também o papel dos Agentes Comunitários de Saúde, reduzindo seu número e restringindo sua atuação em áreas reconhecidas como vulneráveis e com risco epidemiológico. Além disso, incorpora a ideia de “ações e serviços essenciais e estratégicos da Atenção Básica”, que induz a focalização e seletividade e afeta diretamente o princípio da integralidade no SUS.

No atual contexto de crise econômica, é ainda mais necessário fortalecer o sistema público de saúde, para evitar que os usuários enfrentem as dificuldades conjunturais sem os riscos financeiros decorrentes de gastos pessoais e familiares com serviços privados de saúde. Além disso, uma Atenção Básica forte não é apenas mais efetiva na garantia dos princípios da universalidade e integralidade, mas também é mais eficiente, contribuindo para reduzir desperdícios no sistema de saúde. O momento é de priorizar e fortalecer a Atenção Básica universal e resolutiva.

Causa imensa preocupação a proposição de uma reformulação da PNAB num momento de ataque aos direitos sociais estabelecidos na Constituição Federal de 1988, e de sítio fiscal imposto com a promulgação da Emenda Constitucional 95 agravará o subfinanciamento crônico do SUS, reduzindo progressivamente seus recursos por 20 anos.

Especificamente, a revisão das diretrizes para a organização da Atenção Básica proposta pelo Ministério da Saúde revoga a prioridade do modelo assistencial da Estratégia Saúde da Família no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

Os quase 30 anos de implementação do SUS demonstraram que o poder indutor do gestor nacional a través de modalidades de financiamento, regulamentação das transferências federais aos Estados e Municípios, e incentivos econômicos às prioridades programáticas cumpre um papel ainda insubstituível na consolidação da descentralização organizativa da rede de serviços e da garantia do acesso universal da população.

Embora a minuta da PNAB ora em discussão afirme retoricamente a Saúde da Família como estratégia prioritária para expansão e consolidação da Atenção Básica, o texto na prática rompe com sua centralidade na organização do SUS, instituindo financiamento específico para quaisquer outros modelos na atenção básica (para além daquelas populações específicas já definidas na atual PNAB como ribeirinhas, população de rua) que não contemplam a composição de equipes multiprofissionais com a presença de agentes comunitários de saúde. Esta decisão abre a possibilidade de implantar formas organizativas de atenção básica orientadas por princípios de focalização e seletividade opostos aos da Atenção Primária em Saúde estabelecidos em Alma-Ata e adotados no SUS.

O sucesso da expansão da atenção básica no país nos últimos anos e seus efeitos positivos no acesso a serviços de saúde e na saúde da população decorre da continuidade da indução financeira da Estratégia Saúde da Família sustentada ao longo do tempo e reforçada nos últimos três anos com o Programa Mais Médicos. Resultados obtidos e sistematizados pela Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde – Rede APS demonstraram sistematicamente e com provas científicas internacionalmente reconhecidas, a superioridade do modelo assistencial da Saúde da Família quando comparado ao modelo tradicional. Sua maior capacidade de efetivação dos atributos da atenção primária integral produz impacto positivo sobre a saúde da população, com redução da mortalidade infantil, doenças cardiológicas e cerebrovasculares e das internações por condições sensíveis à atenção primária. Ao financiar com PAB variável também a atenção básica tradicional, a proposta de reformulação da PNAB ameaça estes sucessos. Além de abolir na prática a prioridade da ESF, em um contexto de retração do financiamento e sem perspectivas de recursos adicionais, é muito plausível estimar que o financiamento destas novas configurações de atenção básica será desviado da Estratégia Saúde da Família.

A esta reformulação somam-se outras questões críticas do financiamento da atenção básica decorrentes do fim dos blocos de financiamento do SUS. Esta decisão penaliza a capacidade de indução do SUS em favor da Saúde da Família e da Atenção Básica, não garantindo sua prioridade pelos governos municipais. Nossa crítica não contradiz a necessária adequação da rede básica de saúde às especificidades loco regionais, que devem ser financiadas mediante um aumento considerável do PAB fixo, cujo valor médio nacional de R$24,00 per capita ao ano é quase irrisório, estando muito defasado frente aos custos de manutenção e desenvolvimento dos serviços necessários para responder às necessidades de saúde da população. Urge majorar o PAB fixo para ampliar capacidades e autonomia das secretarias municipais de saúde, mantendo a prioridade à Saúde da Família.

A reformulação proposta também ameaça a presença do Agente Comunitário de Saúde como integrante e profissional da atenção básica. Com a expansão da Saúde da Família com cobertura de territórios em áreas urbanas de diferentes estratos socioeconômicos faz-se indispensável fortalecer o papel do ACS, redefinindo e qualificando sua intervenção na comunidade como agente de saúde coletiva, elo entre o serviço de saúde e a população. O ACS conhece e reconhece as necessidades populacionais do território e deve ser contemplado com iniciativas de educação permanente que apoiem seu trabalho de promotor da saúde, atuando na mobilização social para enfrentamento dos determinantes sociais e em ações estratégicas frente aos problemas de saúde da população.

Preocupante também é a implantação de modo simplificado, ou reducionista, de uma “relação nacional de ações e serviços essenciais e estratégicos da AB”. A ferramenta pode contribuir para a garantia de padrões essenciais mínimos mais qualificados e uniformes em todas as unidades básicas de saúde do país e mesmo de padrões estratégicos mais avançados de acesso e qualidade.

Entretanto, cabe alertar que este dispositivo também denominado “carteira de serviços” ou “cesta básica de serviços” tem sido utilizado para definir oferta seletiva de procedimentos acoplada à implementação de seguros focalizados, em resposta simplificada às demandas de cobertura universal das agências internacionais. No Brasil, este instrumento poderá comprometer a integralidade da Atenção Básica e do SUS se não houver um compromisso explícito de gestores e profissionais de saúde com oferta ampla e de qualidade das ações, conforme as necessidades de saúde da população.

A Abrasco se manifesta pela manutenção da PNAB 2011 até a conclusão de discussão democrática e aprofundada por gestores, usuários, profissionais, representantes da sociedade civil organizada e todos os interessados no pleno desenvolvimento e aperfeiçoamento dos SUS, e não “a toque de caixa” nesse momento de severa restrição de financiamento das políticas públicas, de grande fragilidade institucional e de continuadas ameaças ao SUS universal, integral, democrático e de qualidade.

Associação Brasileira de Saúde Coletiva

3 de agosto, de 2017

Discussão de estratégias metodológicas para avaliação de impacto do PMM na OPAS

Integrantes do comitê coordenador da Rede APS estão reunidos na OPAS em Brasilia  em uma oficina de trabalho para discutir  estratégias metodológicas para avaliação de impacto do PMM. O encontro acontece na OPAS, em Brasilia. Confira abaixo a programação.

 

Desafios da Avaliação de Impacto do Programa Mais Médicos

Oficina de trabalho

 

Local: Sala Domingos França, Sede da OPAS/OMS Brasília.

Horários: 9h as 17h

Convidados:

  • Allan Claudius Queiroz Barbosa – UFMG
  • Everton Nunes – UNB
  • Leila Amorim – UFBA
  • Leila Posenato – IPEA
  • Leonor Pacheco – UNB
  • Ligia Giovanella – ENSP/Fiocruz
  • Luiz Augusto Facchini – UFPEL
  • Rosana Aquino G. Pereira – UFBA
  • Sabado Nicolau Girardi – Nescon/UFMG
  • Thiago Rocha – UFMG
  • Juliana Goulart – UFMG

 

Objetivos: Dar continuidade a discussão sobre os desafios da avaliação de impacto do Programa Mais Médicos e avançar na construção de estratégias metodológicas para avaliação de impacto do Projeto Mais Médicos nas condições de saúde da população. 

 

Manhã

 

Tarde

 

9h: Apresentação e boas vindas

 

14h: Experiência dos pesquisadores em avaliação de impacto

 

9h15: Apresentação documento: Notas para discussão de uma proposta de avaliação de impacto do Projeto Mais Médicos para o Brasil – PMMB – Rosana Aquino (UFBA)

 

15h: Discussão e encaminhamentos

 

11h: Debate

 

17h: Encerramento

 

 

Luiz Facchini fala sobre a reformulação da PNAB – Política Nacional de Atenção Básica

Em contagem regressiva para o fim da Consulta Pública para revisão da PNAB – Política Nacional de Atenção Básica, que está aberta até 6 de agosto, a  Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde – Rede APS ouviu o professor Luiz Augusto Facchini, da Universidade Federal de Pelotas, ex-presidente da Abrasco e coordenador da Rede de Pesquisa em Atenção Primária a respeito das possíveis mudanças na PNAB. Na entrevista, o professor afirma que “O foco deve ser o investimento em políticas gratuitas, equitativas e universais, e não em planos populares de saúde.” Além disso, debate o papel dos Agentes Comunitários de Saúde e a implementação da carteira de serviços na APS.

O documento estabelece as diretrizes e normas para a organização da atenção básica, para a Estratégia Saúde da Família – ESF e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS. Nesse sentido, seu conteúdo é crucial para os caminhos da Atenção Primária no país e afeta diretamente gestores, profissionais e usuários do SUS.

Na minuta da nova PNAB divulgada após a reunião da Comissão Intergestores Tripartite – CIT, há alterações significativas referentes à organização e financiamento da Atenção Básica. Institui financiamento específico para quaisquer outros modelos na atenção básica, abrindo a possibilidade de financiar com o Piso de Atenção Básica Variável equipes tradicionais de Atenção Básica. Afeta também o papel dos Agentes Comunitários de Saúde, reduzindo seu número e restringindo sua atuação em áreas reconhecidas como vulneráveis e com risco epidemiológico. Além disso, incorpora a ideia de ações e serviços essenciais e estratégicos da Atenção Básica, o que afeta diretamente o princípio da integralidade no SUS.

+ Acesse aqui a consulta pública da minuta na plataforma FormSUS.

+ Acesse aqui a minuta produzida pelo Grupo de Trabalho da CIT.

Confira a entrevista completa:

Rede APS: Nesse mês, a Abrasco criticou a revisão da PNAB através de uma nota, afirmando que “imensa preocupação a proposição de uma reformulação da PNAB num momento de ataque aos direitos sociais estabelecidos na Constituição Federal de 1988.” Quais os riscos da reformulação da PNAB nesse contexto?

Facchini: O maior risco é de criar as condições para redução de escopo da AB, com o fim da prioridade do modelo da Estratégia Saúde da Família para organizar a rede básica de saúde e o SUS. Necessitamos de adequações e ampliações da AB para atender a particularidades loco-regionais e populacionais, que devem ser financiadas com recursos novos, como por exemplo o aumento expressivo do PAB fixo, fortalecendo a Saúde da Família, em vez de abrir as portas para sua extinção no SUS.

Rede APS: Na sua avaliação, esse contexto de crise ameaça o SUS?

Facchini: A crise não deveria colocar em risco o SUS e seus princípios de universalidade e integralidade. Ao contrário, em momentos de crise econômica necessitamos de um fortalecimento do sistema público de saúde, para ajudar as pessoas a enfrentar as dificuldades conjunturais sem os riscos financeiros decorrentes de gastos com saúde. Além disso, uma APS forte não é apenas mais efetiva na garantia dos princípios da universalidade e integralidade, mas também é mais eficiente, contribuindo para reduzir desperdícios no sistema de saúde. Logo, o momento é de priorizar a APS. No entanto, infelizmente vivemos uma época de fragilidade das políticas públicas, universais e equitativas, que afirmem o direito à Saúde garantido pelo Estado, conforme estabelece a Constituição Federal de 1988.

Rede APS: Uma especificidade do cenário brasileiro é a importância estratégica dos Agentes Comunitários de Saúde no interior das equipes de ESF e outras modalidades de Atenção Básica. Nos últimos anos, vem acontecendo uma série de medidas legislativas (como a portaria 958/2016) que afetam drasticamente essa categoria. Qual o papel dos ACSs na organização da Atenção Básica do país?

Facchini: Os ACS são reconhecidos como uma fortaleza da ESF em estudos nacionais e internacionais sobre a AB no SUS. Entretanto, nos últimos anos houve uma redução do papel central do ACS na AB, talvez decorrente de mudanças demográficas e epidemiológicas, ou da melhoria das condições de vida da população mais pobre, durante os governos Lula e Dilma. Neste contexto, torna-se necessário atualizar o trabalho do ACS, para além de visitas e/ou monitoramento regular das famílias. Mas isso não deve ser razão para acabar com a categoria profissional e sim para redefinir seu papel no âmbito de uma equipe multiprofissional de AB. Para o fortalecimento de suas ações, os ACS devem receber Educação Permanente capaz de articular seu trabalho ao conjunto de ações de universalização da saúde no país. O potencial de impacto do trabalho do ACS é grande. Por exemplo, estima-se um incremento de 50% na prevalência de revisão de parto em função da visita de um profissional da ESF ao domicílio da puérpera na primeira semana de vida do bebê. Essa simples iniciativa pode transformar a revisão do parto de um problema negligenciado em uma ação de alcance universal, beneficiando as famílias e grupos sociais mais pobres. Logo, ao invés de restringir e enfraquecer o trabalho dos ACS, é necessário expandir e rearticular sua intervenção em função das necessidades de saúde da população e da reorganização das ações individuais e coletivas da ESF.

Rede APS: A carteira de serviços é uma ferramenta usada em alguns sistemas de saúde pelo mundo e foi implementada recentemente no município do Rio de Janeiro. Quais as vantagens e desvantagens da implementação nacional de carteiras de serviço na Atenção Básica?

Facchini: A ideia de uma carteira de serviços não é necessariamente um risco para o SUS e a Atenção Básica. Ela pode ser um conjunto de definições, de responsabilidades da gestão e dos profissionais de saúde, disponibilizando para a população todos os itens necessários em termos de procedimentos, de cuidado, de práticas, de suprimentos, de infra-estrutura, de processos organizativos e de trabalho que garantam a atenção às necessidades de saúde da população. Apesar da marcante expansão da ESF no país, os problemas de qualidade no cuidado e acompanhamento de gestantes, crianças e usuários com doenças e condições crônicas. A carteira de serviços pode contribuir para a ampliação e qualificação das ações de saúde na ESF. Entretanto, a carteira de serviços também pode ser uma ameaça à universalidade e integralidade da AB.

Rede APS: Quando há riscos?

Facchini: Quando o dispositivo representa restrição, selecionando problemas e morbidades específicas, esquecendo a saúde como um processo complexo, longitudinal e amplo. Em diversos países, a carteira de serviços tem sido utilizada para a oferta de APS seletiva, com a disponibilização de uma “cesta” reduzida de serviços públicos e gratuitos, deixando a população à mercê da mercantilização da saúde e os grupos mais pobres e vulneráveis inteiramente desassistidos. Esta carteira de serviços reduzida, simplificada, distorce e enfraquece a APS e em consequência o SUS. A carteira de serviços também pode ser utilizada como estratégia de contratação de Organizações Sociais e esquemas de terceirização e privatização, ao estabelecer contratos de gestão baseado nos procedimentos e serviços disponíveis na carteira. O instrumento não é intrinsicamente ruim e não tem capacidade autônoma de destruir um sistema universal de saúde. Entretanto seu escopo de práticas profissionais e responsabilidades de gestão é expressão de políticas destinadas a fortalecer ou fragilizar os sistemas universais de saúde, com o predomínio do âmbito público e gratuito, ou do âmbito privado, mercantil.

Rede APS: Por fim, nesse contexto de crise e retrocessos, que tipos de bandeiras e afirmações devem estar na formulação de políticas de Atenção Básica para o país?

Facchini: O foco devem ser o investimento em políticas gratuitas, equitativas e universais, e não em planos populares de saúde. O mais importante é reafirmar a expansão e o fortalecimento da APS nesse momento de crise. O movimento sanitário, a Abrasco e as sociedades científicas e profissionais, a Rede de Pesquisas em APS, os grupos de pesquisa, todos devemos defender a universalização do SUS, a manutenção e o fortalecimento da ESF e do Programa Mais Médicos e de ações que objetivem uma AB pública e de qualidade no Brasil.

Nota publicada no site da ABRASCO – https://www.abrasco.org.br/site/